terça-feira, 29 de janeiro de 2013

Universidades federais finalmente expostas na Scientific American Brasil

Professor Estável


Anos atrás fiz várias contribuições para a Scientific American Brasil, com dois artigos, diversas notas de divulgação e jornalismo científico, revisões técnicas para a Série Gênios da Ciência e uma resenha de um livro de Richard Dawkins, entre outras. No final do ano passado, porém, apresentei uma proposta ao editor Ulisses Capozzoli: publicar um artigo sobre as mazelas das universidades federais brasileiras. Pedi a ele que visitasse este blog, para ter uma ideia melhor sobre o que eu tinha em mente. Capozzoli imediatamente concordou, percebendo que certas questões sobre as universidades públicas precisam ser urgentemente discutidas.

A edição de fevereiro de Scientific American Brasil com o artigo em questão já está nas bancas brasileiras e portuguesas. No editorial, Capozzoli dá especial atenção ao artigo, afirmando que "o que ocorre nessas instituições [universidades públicas] é a ação nefasta de grupos/pessoas interessadas na fermentação interna da mediocridade intelectual como estratégia de sobrevivência parasitária".

Com permissão do editor, reproduzo aqui uma versão do artigo original, adaptada ao perfil deste blog. 


Agradeço ao editor Ulisses Capozzoli não apenas pela importante iniciativa, mas principalmente pela cuidadosa revisão que ele fez na primeira versão do texto. 


Parte significativa do artigo contém informações e discussões já veiculadas aqui, principalmente sobre o problema da estabilidade de emprego entre professores de instituições federais de ensino superior. Mas há também tópicos que ainda não exploramos neste blog. 


Veremos, agora, as reações dos diferentes segmentos sociais deste país. As primeiras mensagens de reação já começaram a chegar, principalmente de jovens estudantes.


Desejo a todos uma leitura crítica.

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Ciência e Educação (de qualidade) são a Base da Esperança


Em 1998 o Governo Federal criou por decreto a Gratificação de Estímulo à Docência no Magistério Superior. Tratava-se de um adicional ao salário dos docentes de instituições federais de ensino superior (ifes), cujo valor dependia da produtividade em ensino, pesquisa, extensão e administração de cada professor. Pouco tempo depois o valor máximo desta gratificação foi incorporado aos salários de todos os docentes concursados das ifes. Os professores que sistematicamente tinham produtividade máxima (de acordo com critérios governamentais) continuaram a receber em seus contra-cheques o mesmo valor de meses anteriores. Os demais, com produtividade inferior, conquistaram significativo aumento em seus vencimentos. 

Este é um exemplo que retrata com fidelidade o quadro típico da universidade pública brasileira: a falta de meritocracia. E, sem reconhecimento efetivo de mérito, como promover progresso científico e tecnológico relevante? Esta falta de políticas meritocráticas na academia brasileira atinge não apenas professores e pesquisadores, mas também alunos e funcionários do quadro técnico-administrativo. 

Neste artigo esboço de forma muito breve alguns dos mais graves problemas crônicos do ensino superior público - com ênfase nas universidades federais - e algumas consequências de tais problemas, geralmente gravitando ao redor da confortável garantia de emprego para todos os professores concursados. O foco deste texto se justifica de forma simples. As universidades federais de nosso país têm um papel estratégico fundamental em toda a rede educacional brasileira. Ações e políticas de instituições privadas e estaduais de ensino superior ou médio são muitas vezes dependentes de práticas comuns às universidades federais espalhadas pelo território nacional, as quais são fortemente controladas pelo Governo.

Instituições federais de ensino superior não têm autonomia para contratação, demissão ou negociação salarial de professores. Concursos públicos, para fins de contratação de novos docentes, somente podem ser realizados através de editais nacionais do Governo Federal. Localmente, não há como negociar a contratação de professores, não importando a competência dos mesmos, fatores emergenciais ou as necessidades da instituição. Sempre devem ser aguardados os editais governamentais. Demissões somente podem ocorrer em casos extremamente graves, como abandono do cargo. Participei, anos atrás, de uma comissão interna da Universidade Federal do Paraná (UFPR) que deveria avaliar a situação de um docente que não aparecia no trabalho há pelo menos seis meses. Esta foi uma demonstração muito clara da lentidão administrativa de uma universidade federal. Se um docente lecionar de forma incompetente ou se não realizar atividades de pesquisa, extensão ou administração, isso não caracteriza motivo suficiente para demissão ou perda de privilégios básicos do cargo. Vale observar que estou falando da prática e não daquilo que consta em documentos oficiais. Também não estou discutindo sobre professores substitutos, os quais são contratados por tempo determinado, ganhando salários muito inferiores aos de concursados.

Se um professor é contratado após realização de concurso público, ele deve cumprir um estágio probatório de três anos. Após este período, seu cargo está praticamente garantido, independentemente de sua produção posterior ao longo de toda a vida acadêmica restante. Além disso, docentes podem eventualmente progredir em planos de carreira, mas jamais regridem. Uma vez que um docente se torna Associado III, por exemplo, jamais pode regredir para Associado II ou I, mesmo que nada mais produza após sua última progressão funcional. 

É claro que há professores de ifes que mantém excelente produção acadêmica. Mas existem também aqueles que faltam às aulas (sem registro oficial de tais faltas), não cumprem ementas de disciplinas ou horários de aulas, não realizam pesquisa alguma ou qualquer atividade de extensão e nem orientam alunos de graduação ou de pós-graduação. Tais professores podem contar com os mesmos benefícios da estabilidade dada aos mais produtivos. 

São várias as consequências do conforto conquistado através da estabilidade irrestrita. Uma delas é o fato de que comumente professores mais antigos se sentem intimidados por jovens que demonstram talento evidentemente superior à média, e muitas vezes usam mecanismos burocráticos absurdos como tentativa desesperada para nivelar todos a um mesmo patamar de desempenho mediano. Cito um caso que eu mesmo testemunhei. Durante minha chefia do Departamento de Matemática da UFPR, de 2005 a 2007, fui relator de um processo de pedido de afastamento de um casal de jovens professores recentemente contratados pelo Departamento de Estatística daquela instituição: Leonardo Soares Bastos e Thaís Cristina de Oliveira Fonseca. Ambos foram convidados para realizar doutoramento em ótimas universidades britânicas, sob a orientação de dois pesquisadores de excelente reputação internacional e com bolsas de estudos pagas pelas respectivas instituições estrangeiras. Apesar do Departamento de Estatística ter aprovado as duas solicitações e de meu parecer ter sido justificadamente favorável, o Setor de Ciências Exatas (instância superior) indeferiu os pedidos. A alegação foi o estágio probatório, o qual deveria ser cumprido por ambos. Legalmente, o estágio probatório poderia ser cumprido no exterior, uma vez que o vínculo empregatício com a UFPR seria mantido. E os membros do Conselho do Setor de Ciências Exatas sabiam disso. Mas o fato é que vi de perto os verdadeiros motivos para negar os pedidos de afastamento temporário: o medo provocado por jovens que crescem rapidamente em suas carreiras. O resultado não poderia ser outro. O ambicioso casal pediu demissão e seguiu rumo para a Inglaterra. Hoje são professores doutores das Universidades Federal Fluminense e Federal do Rio de Janeiro. Ou seja, apesar das políticas das ifes serem praticamente as mesmas em todo o país, este casal ainda insiste em apostar no futuro de nossa nação. Afinal, o Brasil precisa de estatísticos de alto nível. 

A consequência mais óbvia da estabilidade irrestrita para docentes das ifes é a falta de um ambiente competitivo na vida acadêmica pública. É claro que muitos professores com produção científica (nem todos) têm acesso a bolsas de estudo e/ou pesquisa, o que caracteriza um certo reconhecimento de mérito por parte de órgãos de apoio que são geralmente externos às ifes. E a manutenção dessas bolsas depende da contínua produção científica dos beneficiados, de acordo com critérios muitas vezes exigentes. No entanto, seus cargos em suas instituições de origem jamais estão ameaçados, ainda que não produzam conhecimento algum. E mesmo em casos de faltas graves, como a prática comum de lecionar conteúdos de forma superficial e até errada, o cargo continua garantido. As ifes ainda contam com o trabalho competente de diversos pesquisadores e cientistas brasileiros, algo que dificilmente pode ser encontrado em universidades privadas deste país. Mas, em geral, as condições de trabalho deles em pouco difere daquelas ofertadas a todos os demais. Temos, assim, um ambiente de pouco estímulo à produção intelectual relevante do ponto de vista do exigente cenário internacional.

O Brasil não é internacionalmente reconhecido como uma nação que produz ideias. Os Estados Unidos são um país tão novo quanto o nosso. Mas as melhores universidades do planeta estão na América do Norte, de acordo com diversas pesquisas internacionais realizadas de forma independente. Por que o Brasil não consegue se destacar em produção científica? Não estaria na hora de percebermos que estamos fazendo alguma coisa errada? Mentes brilhantes nosso país tem desde muito tempo atrás.

Carlos Chagas foi oficialmente indicado ao Nobel de Medicina em duas ocasiões. Perdeu porque Afrânio Peixoto era contrário à política meritocrática adotada por Chagas durante sua gestão no antigo Departamento de Saúde Pública do Governo Federal. Deste modo, Peixoto e colegas fizeram campanha perante a Comissão Nobel, no Instituto Karolinska (Suécia), afirmando, resumidamente, que o trabalho de Chagas não merecia atenção alguma. 

Natural de Petrópolis, RJ, Peter Medawar ganhou o Nobel de Medicina, mas durante a juventude teve a cidadania cassada pelo Governo Federal, simplesmente porque não se apresentou ao serviço militar obrigatório. Os resultados de suas pesquisas sobre transplantes de tecidos vivos estão acessíveis a qualquer brasileiro, incluindo militares. Mas a cidadania de Medawar somente foi restaurada muito tempo depois e de forma absolutamente discreta. Por sorte Medawar tinha cidadania britânica também. Assim, Inglaterra ganhou um Prêmio Nobel a mais e o Brasil até hoje ignora a fundamental importância da ciência feita em ambientes competitivos. 

Universidades estadunidenses também conferem estabilidade para professores. Mas são poucos os que recebem este benefício, conhecido como tenure. O critério é simplesmente meritocrático. E tal mérito não se avalia através de concurso público realizado em dois ou três dias, mas ao longo de uma extensa carreira marcada por contribuições de elevada relevância acadêmica e negociações. A concessão de estabilidade irrestrita a qualquer professor universitário ou pesquisador é uma forma extremamente eficaz para cultivar um ambiente sem desafios significativos. E ciência, como qualquer outra atividade profissional de alto nível, se fundamenta na constante luta para vencer desafios.

Um docente de instituição federal de ensino superior pode ter acesso a bolsas governamentais de pesquisa e orientar alunos de pós-graduação, se demonstrar produção científica principalmente na forma de artigos publicados em certos veículos especializados de circulação internacional. No entanto, em áreas como matemática, física, química e biologia, esta produção é especialmente avaliada a partir de números que nem sempre têm a ver com qualidade. Avalia-se a quantidade de artigos publicados em periódicos reconhecidos pelos órgãos de apoio à pesquisa, mas raramente se avaliam fatores extremamente importantes, como impacto social de pesquisas e a efetiva participação dos envolvidos. 

A revista britânica Nature, por exemplo, adota a seguinte política editorial: ao final do artigo publicado deve ser especificada a real contribuição de cada um dos autores. No entanto, a maioria dos periódicos especializados não adota esta postura. A inclusão de nomes de colegas em artigos científicos tem sido cada vez mais frequente, mesmo quando estes colegas não participam de forma alguma no projeto em questão. E apenas uma minoria dos professores pesquisadores das ifes consegue publicar contribuições que demonstram algum impacto significativo à ciência. O mecanismo mais imediato para avaliar impacto é citação. Em geral, quanto mais citações um artigo recebe na literatura especializada internacional, mais relevante é o impacto do trabalho citado. Porém, mesmo esta visão quantitativa tem limitações.

Por conta de um único artigo publicado na revista Nature, o curitibano Cesar Lattes revolucionou a física de partículas elementares. E, por conta deste trabalho, ele também foi indicado ao Nobel. Quantos outros pesquisadores deste país podem dizer que passaram por experiência parecida? Em avaliações de produtividade, para fins de progressão funcional nas ifes, este artigo de Cesar Lattes valeria tanto quanto um trabalho obscuro publicado em Physics Essays, um dos piores periódicos de física em circulação. E valeria a metade de um livro didático publicado, independentemente de sua qualidade.

A verdade é que vivemos em uma nação na qual há um número crescente de doutores que sequer sabem ler inglês, situação essa simplesmente inadmissível nos países desenvolvidos, principalmente nas áreas científicas. E sem conhecimentos básicos de inglês, como produzir ciência?

De forma alguma recomendo que deveríamos copiar o modelo acadêmico norte-americano. Mas certamente poderíamos aprender muito com modelos que demonstram claramente funcionar melhor do que o nosso. Afinal, as universidades estadunidenses, apesar de inúmeros problemas graves, produzem a maioria das mais impactantes contribuições científicas e tecnológicas do mundo. O Brasil simplesmente não compete.

Nos Estados Unidos jovens ingressam em universidades. No Brasil, jovens ingressam em cursos universitários. Esta é uma diferença profunda entre os dois sistemas. Se um aluno de uma instituição federal de ensino superior consegue vencer as absurdas barreiras do Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM) e do vestibular, ele está praticamente preso a um curso escolhido enquanto cursava o ensino médio e, portanto, enquanto estava longe de qualquer ambiente universitário. Se este aluno percebe que o curso escolhido não está de acordo com seu perfil pessoal, ele dificilmente terá chances de conseguir uma transferência. A burocracia é muito complicada e prática para poucos. Provavelmente terá que se submeter ao ENEM e ao vestibular de novo ou simplesmente desistir, como muitos o fazem. Já em uma universidade norte-americana, seja privada ou estadual, o recém ingresso encontra a oportunidade de conhecer todas as diferentes realidades das opções disponíveis para graduação. Ele tem a chance de escolher seu futuro profissional a partir de um ambiente genuinamente universitário. No Brasil, as ifes operam como instituições poliversitárias. E este modelo é copiado por instituições estaduais e privadas do ensino superior brasileiro. Logo, o Brasil não tem ideia do que é uma universidade. 

Um sistema de ensino superior que exige de um adolescente a escolha de seu curso superior antes de ingressar em qualquer universidade é um sistema que negligencia sua juventude. 

Nas ifes também não existe, de forma séria, a tradição das associações de ex-alunos. Isso significa que as ifes, em geral, não avaliam as carreiras de seus egressos. Uma universidade que não está interessada em saber sobre o destino profissional de seus ex-alunos é uma instituição que não está interessada em conhecer seu papel real perante a sociedade. Novamente temos negligência.

Em 2007 todas universidades federais assinaram o polêmico contrato REUNI (Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais) com o Governo. A Universidade Tecnológica Federal do Paraná (UTFPR) foi a última a assinar este pacto. Em troca de dinheiro, essas ifes assumiram o compromisso de aumentar gradualmente suas taxas de conclusão de curso para noventa por cento. Do ponto de vista educacional, essa exigência é simplesmente irresponsável. Cursos nas áreas científicas, por exemplo, comumente apresentam índices de reprovação muito superiores a dez por cento, mesmo nas melhores universidades do mundo. Isso significa que tanto o Governo Federal quanto os professores que alegam lutar pelo ensino superior público de qualidade em seus emocionais movimentos de greve, estão negligenciando o futuro da nação de forma realmente perigosa. A preocupação evidente é com quantidade de jovens que se formam em graduações e não com qualidade de ensino.

Em 2012 a consultoria britânica Economist Intelligence Unit publicou um levantamento global de educação que comparou quarenta países, levando em conta notas de testes realizados por alunos e qualidade de professores avaliados entre 2006 e 2010. O Brasil ficou em penúltimo lugar, denunciando um sistema educacional básico que supera apenas o da Indonésia. Este resultado desastroso é uma das múltiplas evidências de que professores formados pelo ensino superior brasileiro não estão demonstrando competência profissional. Diante da promessa do Governo e das universidades federais de que as taxas de conclusão de curso deverão subir indiscriminadamente para noventa por cento, percebe-se que o futuro reserva um desempenho educacional ainda pior para o Brasil, a longo prazo.

Usualmente também não existem programas de honors (ou equivalentes) nas ifes. Esses programas constituem em uma série de procedimentos de avaliação que reconhecem os alunos que se destacam como os melhores em suas respectivas turmas de formatura. Na prática, os programas de honors operam como cartas institucionais de recomendação que simplesmente afirmam: "Este indivíduo realizou seu curso com distinção e louvor." É uma forma de ajudar a alavancar as carreiras dos mais brilhantes. Nas ifes, no entanto, novamente faz-se questão de tratar todos de forma igualitária. Temos assim outro exemplo de negligência em um país cujas universidades públicas geralmente consideram elitismo como algo socialmente reprovável. 

Não existem mais cátedras nas ifes. Se um professor de universidade federal falece, pede exoneração do cargo ou se aposenta, ele libera uma vaga. Não importa se este docente orientou dezenas de doutores, publicou centenas de artigos de elevado impacto, exerceu relevantes atividades administrativas ou influenciou de forma construtiva milhares de pessoas ao longo de sua carreira. Simplesmente não existe continuidade de sua obra. Este senso de continuidade deveria ser estabelecido institucionalmente através da cátedra. O célebre astrofísico Stephen Hawking, da Cambridge University, ocupou a mesma cátedra de Sir Isaac Newton, um dos pais da ciência moderna. Trata-se de um compromisso que deve transcender a mortalidade física dos grandes nomes da ciência mundial. Nas ifes, porém, qualquer obra, por mais relevante que seja, deve morrer junto com o seu autor. O grande lógico brasileiro Newton da Costa é professor catedrático da UFPR. Sua cátedra é um cargo vitalício, conquistado décadas atrás. No entanto, apesar deste grande cientista ser responsável pela formação de uma importante escola de lógicos brasileiros reconhecidos internacionalmente, a UFPR não se preocupa em ocupar esta cátedra com algum profissional que continue tal tradição. Isso porque todas as cátedras foram extintas, não apenas na UFPR, mas em todas as ifes. Temos aqui um exemplo de negligência com obras relevantes. Falta a percepção de que memória não se promove apenas com museus ou nomes dados a salas de aula e bibliotecas.

Mantenho um blog no qual promovo discussões e articulo ações sobre educação, com especial ênfase à matemática. Neste sítio convoquei alunos de ifes a espalharem cartazes em suas instituições de ensino com a frase "Professor de universidade pública tem seu emprego garantido, independentemente da qualidade de suas aulas." É uma frase simples, excessivamente resumida, mas que retrata um fato importante. Os jovens que atenderam ao pedido foram surpreendidos com manifestações imediatas de extrema intolerância, vindas justamente de professores. Docentes concursados, que viram esses cartazes, simplesmente os arrancaram. Cartazes colados em paredes foram dilacerados. Há pouco espaço para autocrítica nas ifes. 

Recentemente recebi convite da revista Sem Fronteiras, da Secretaria de Estado da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior (SETI) do estado do Paraná, para escrever um artigo. Imediatamente escrevi um texto crítico sobre a educação brasileira. Recebi a resposta de que aquele texto não poderia ser publicado, pois não interessava à SETI criar atritos políticos com demais setores do governo paranaense. Em função desta resposta, escrevi outro artigo, no qual eu criticava o papel do filósofo da ciência nos dias de hoje. O artigo foi publicado na íntegra. Ou seja, criticar filósofos não tem problema. Mas criticar o sistema público de ensino é desaconselhável. E isso ocorreu em uma revista chamada Sem Fronteiras

Quando propus o presente artigo ao editor Ulisses Capozzoli, a resposta foi imediata: se a Scientific American Brasil publica artigos contendo críticas a universidades dos Estados Unidos e de outros países, por que não criticar universidades brasileiras? Esta é uma postura genuinamente científica. Sem crítica, não se faz ciência e nem educação. Sem crítica, não se sustenta uma instituição de ensino séria e competitiva e, em particular, uma universidade. E os exemplos de negligência dados são igualmente exemplos de falta de crítica.

Professores de física falam de infinitésimos em suas aulas de graduação e pós-graduação, quando modelam fenômenos físicos através de ferramentas do cálculo diferencial e integral. No entanto, o cálculo ensinado nas mesmas instituições não emprega infinitésimos, conceito este fundamental em um estudo avançado conhecido como análise não standard. Professores de cursos de letras, quando lecionam linguística, discutem sobre gramáticas gerativas de Chomsky, sem de fato conhecer teorias de conjuntos, o que torna o estudo sério a respeito do tema simplesmente impossível. E docentes de cursos de filosofia abordam filosofia da ciência sem jamais terem tido qualquer contato com atividades científicas, no sentido estrito do termo. Apesar destes problemas não serem exclusivos das universidades federais, certamente a perpetuação de tamanha ignorância em tais instituições constitui um péssimo exemplo que se propaga em praticamente todas as universidades do país. O próprio Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) considera lógica matemática como especialidade da álgebra, em sua classificação de áreas do conhecimento, demonstrando desconhecer o que é lógica matemática.

O conceito de universidade deve apelar fundamentalmente para uma visão de universalidade, como o próprio nome sugere de forma trivial. Muitas das mais importantes contribuições científicas da história exigiram pesquisas interdisciplinares. A descoberta da estrutura molecular do DNA, por exemplo, somente foi possível graças a aplicações de métodos de ciências físicas em biologia. A própria filosofia da ciência, nos dias de hoje, avançou para muito além das ideias de Karl Popper, autor ainda venerado em graduações brasileiras como uma espécie de líder atual que conduz aos temas mais avançados da metodologia e da epistemologia. O casamento entre filosofia da ciência e métodos avançados de lógica matemática praticamente não é discutido nas salas de aulas de nossas universidades. Enquanto nossos professores universitários em geral ignoram as profundas riquezas da psicologia matemática e das aplicações da teoria matemática das decisões em ciências humanas, entre outros exemplos de interdisciplinaridade, o Brasil continua estagnado perante as nações que tradicionalmente produzem conhecimento científico de alto nível e que, por conta disso, crescem dos pontos de vista social e econômico. Não é por acaso que nossas graduações em engenharias são reconhecidas apenas como cursos técnicos em países europeus.

Fala-se muito da necessidade de valorizar o professor no Brasil. No entanto, os professores do ensino público frequentemente querem impor essa valorização através de greves que reivindicam melhores salários para todos, sem qualquer discriminação. Se docentes desejam honestamente ser valorizados, poderiam examinar certos exemplos que ocorrem em outras categorias profissionais. Médicos, psicólogos, engenheiros, arquitetos e até mesmo corretores de imóveis contam com o apoio de códigos de ética. Professores, porém, não têm qualquer código de ética para estabelecer padrões de qualidade de suas profissões e mecanismos de proteção e punição. Códigos de ética certamente não resolvem de maneira definitiva o problema da valorização profissional. Mas constituem um importante passo, de caráter muito mais meritocrático do que greves. Mas, para isso, seria necessário que os docentes dialogassem com especialistas em ética, cujas competências sejam internacionalmente reconhecidas. Sem diálogo entre diferentes áreas do saber, não há universidade e nem educação. 

Para o leitor perceber melhor as origens da incompetência dos professores brasileiros, recomendo a leitura deste artigo de Paula Louzano e colaboradores.

Nos Estados Unidos todas as instituições de ensino superior são pagas, incluindo estaduais e municipais. No Brasil as universidades públicas são gratuitas. Este é um exemplo brasileiro de profunda responsabilidade social. Mas qualquer que seja a realidade educacional e científica de uma nação, sempre haverá problemas graves a serem resolvidos. Portanto, a visão crítica jamais deve deixar de existir. Porém, levando em conta nossa realidade de hoje, fica evidente que ainda não encaramos de frente os problemas mais crônicos e graves.

Há muito tempo o Governo Federal tem investido consideráveis verbas para apoiar pesquisas e expandir vagas em universidades. E graças a iniciativas como a criação de institutos de pesquisa, projetos de convênios internacionais e órgãos de apoio ao desenvolvimento científico e tecnológico, o Brasil conseguiu conquistar um certo reconhecimento internacional em algumas áreas da medicina, matemática e física, para citar umas poucas. 

Mas a preocupação principal que deve ser colocada, atualmente, é sobre a estrutura fundamental do ensino superior brasileiro. E o primeiro foco de atenção deve ser voltado às instituições federais de ensino superior, as quais respondem por grande parte da produção científica da nação e estão ao alcance de ações imediatas do Governo Federal. Em alguns rankings internacionais, as primeiras universidades brasileiras citadas são duas estaduais de São Paulo. Eventualmente aparecem também nestas listas a Universidade Federal do Rio de Janeiro. Mas suas colocações são sempre modestas. E na rigorosa classificação Shangai, nenhuma instituição brasileira é citada. 

A situação econômica do Brasil, bem como seus reflexos sobre a qualidade de vida de cada um de nós, não serão sustentados a longo prazo sem uma revisão drástica sobre os fundamentos de nossa educação e produção científica e tecnológica. Sem ciência e educação, simplesmente não há esperança.
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Veja aqui algumas críticas a este artigo.

segunda-feira, 28 de janeiro de 2013

Um blog de pouco interesse para mulheres?



Tenho procurado conjugar as ferramentas estatísticas deste blog com aquelas que aparecem na página facebook deste fórum. Vale observar que a página facebook divulga não apenas todas as postagens, mas também notícias em português, inglês e espanhol, relacionadas com educação e matemática, no Brasil e no mundo. Tais notícias são prioritariamente selecionadas a partir de canais do próprio blog. Eventualmente divulgo também de outras fontes. 

Dados curiosos emergem das estatísticas.

Na página facebook, o público que mais curte, compartilha e comenta sobre os textos veiculados é (com ampla diferença) o masculino, na faixa etária entre 18 e 34 anos. E este mesmo perfil se destaca mais ainda quando as estatísticas se referem a discussões sobre os temas divulgados. O público masculino é mais de quatro vezes superior ao feminino, quando as estatísticas são aplicadas a comentários e discussões. Por que isso? Mulheres não estão tão preocupadas com educação e ciência ou este blog carece de elementos que despertem a atenção do público feminino? Esta é uma questão honesta. Eu realmente gostaria de ler algumas opiniões a respeito disso.

Não tenho a pretensão de despertar maior atenção de algum segmento específico, em detrimento de outros. Mas eu gostaria de compreender melhor o perfil dos leitores deste blog. Toda ajuda é bem-vinda.

Também tenho observado, há meses, os casos nos quais leitores acessam o blog a partir do google (o que corresponde à maioria dos casos). Vale a pena conferir os termos de busca mais usados e que permitem acesso a este site. Erros ortográficos não foram corrigidos.

adonai, adonai sant'anna, adonai santana, adonai santanna, bart estuda histori, blog adonai, cravação invisivel, matematicos cegos, natal com matematica, notas da musica dos parabens para voce, desestimulando seu aluno, lecionação por póe doutorados, o que significa o tamanho de um ponto, wikipedia super dotado, confissoes eroticas, confissões eroticas de adolescentes, adonai ufpr, probabilidades e área, absurd, careca brilhante, sou superdotada e já fui a pior aluna, matematicos cegos, "testes de qi não são", frases sobre arte e matematica, "exemplo de interdisciplinaridade", como é a entrevista para a pós graduação, imagens com solidos geometricos, sombras humanas, ironia educação, entrevista para especialização, pesquisar apufpr. 

sábado, 26 de janeiro de 2013

Como confiar em argumentos


Em função da recente discussão sobre a ilusão da previsibilidade, o leitor Tiago Leski fez algumas perguntas em mensagem pessoal, as quais ele gentilmente permitiu que eu publicasse neste blog. Esta é uma versão resumida de sua mensagem: 

"Se você não tivesse fornecido a fórmula e o algoritmo a ser seguido, seria impossível responder qual é o próximo número [na sequência 01, 02, 03, 04, 05, 06, 07, 08]? Mas na maioria das vezes aquele que nos pergunta quer a resposta mais simples, ou seja, já que eu desconhecia os passos, seria correto dizer que o próximo número era 09."


As dúvidas apontadas acima são pertinentes e bastante comuns, apesar de muita gente ser dominada pelo medo de questionar. Creio que todas essas dúvidas podem ser resumidas a uma única questão: O que é um argumento?

Se compreendi bem o questionamento de Tiago Leski, ele está mais interessado em justificativas do que em respostas. Não basta responder qual é o próximo número na sequência 01, 02, 03, 04, 05, 06, 07, 08. É preciso justificar a resposta.

Não existe uma definição suficientemente qualificada para o conceito de argumento, aplicável para toda e qualquer situação em linguagens naturais e/ou formais. Menos ainda se sabe o que é um argumento bom ou válido, a não ser em certos contextos muito restritos. O que existe é uma noção intuitiva para este polêmico conceito. Um argumento é, grosso modo, uma série de raciocínios apresentados para suportar uma proposição. Tal proposição é chamada de conclusão do argumento. É claro que a série de raciocínios pode eventualmente ser unitária: um único raciocínio.

O leitor pode, naturalmente, protestar sobre essa noção de argumento. Afinal, o que é um raciocínio? O que é uma proposição? O que significa "apresentar um raciocínio"? Por isso mesmo insisto neste ponto: a única visão hoje existente para o conceito de argumento (em seu mais amplo sentido possível) é meramente intuitiva, conforme apresentada acima.

Como intuições comumente são distintas entre diferentes pessoas, podemos apelar para o recurso didático da classificação.

Usualmente argumentos são classificados em duas categorias: argumentos livres de risco e argumentos arriscados.

Argumentos livres de risco são muito bem fundamentados em lógica formal. Em certas teorias formais da matemática, um argumento é simplesmente uma relação n-ária entre fórmulas (uma relação aplicável sobre n fórmulas), de modo que a última fórmula nesta relação é única. Daí o uso da expressão "livre de risco". Não existe ambiguidade na conclusão! O argumento livre de risco mais empregado em lógica formal é o célebre Modus Ponens. Modus Ponens é uma relação ternária aplicácel a triplas ordenadas de fórmulas do seguinte tipo: (A, A implica em B, B), sendo que A e B denotam fórmulas.

Vale observar que não estou qualificando o conceito de fórmula. Esta noção depende da teoria formal que está sendo adotada. Para esclarecer a respeito deste assunto recomendo o excelente Introduction to Mathematical Logic, de Elliot Mendelson ou o meu livro O que é um Axioma.

Modus Ponens simplesmente estabelece que a fórmula "B" é uma consequência direta das fórmulas "A" e "A implica em B".

Alguns autores cometem a perigosa audácia de aplicar Modus Ponens em linguagens naturais. Por exemplo: "Se chuto pedra (A) e se chutar pedra implica que meu pé dói (A implica em B), então posso concluir que meu pé dói (B)."

No entanto, a lógica formal permite a concepção de argumentos que não são aplicáveis ao mundo real, pelo menos a princípio. 

Do ponto de vista meramente matemático, nada impede que seja criado (em uma dada teoria formal) um argumento ternário do seguinte tipo: (A, A implica em B, não B), onde A e B são fórmulas.

Se traduzirmos esse tipo de argumento para uma linguagem natural como o português, de forma análoga ao que foi feito anteriormente, teremos a seguinte situação: "Se chuto pedra (A) e se chutar pedra implica que meu pé dói (A implica em B), então posso concluir que meu pé não dói (não B)."

Do ponto de vista meramente intuitivo, existe a tendência natural das pessoas a considerar que o argumento acima não é válido. Isso ocorre porque a noção de argumento em lógica formal não corresponde a noções intuitivas usuais sobre o conceito de argumento. Isso por si só já explica uma série de confusões gigantescas que ocorrem em inúmeras discussões (incluindo algumas que ocorrem neste blog).

Aquele que quiser aplicar o argumento acima ao mundo real, que chute a pedra e veja o que acontece. É uma forma dolorosa de aprender matemática, mas eventualmente eficaz.

São muito comuns as pessoas que estudam lógica de maneira meramente superficial e, a partir disso, tentam impor suas crenças pessoais como certezas inquestionáveis. Uma das mais importantes lições que a ciência e a filosofia de hoje nos ensinaram é que qualquer argumento deve ser analisado de forma profundamente crítica. Não existe terreno firme o bastante na ciência e na filosofia que garanta certeza sobre qualquer ideia não trivial.

Argumentos livres de risco da lógica formal, no entanto, frequentemente são estendidos para argumentações expressas em linguagens naturais. Isso ocorre por conta da aceitação social de tais argumentos. Mas inferir certezas a partir de aceitação social é um passo simplesmente irresponsável.

Já os argumentos arriscados são comuns no estudo de lógicas indutivas. A maneira usual para se lidar com eles é através do uso de teoria de probabilidades. Neste blog há uma curiosa aplicação de argumentos arriscados aqui.

Na lógica formal clássica, argumentos livres de risco usuais permitem obter conclusões verdadeiras a partir de fórmulas verdadeiras. Já nas lógicas indutivas usuais, uma conclusão pode ser falsa mesmo a partir de fórmulas verdadeiras. Daí o emprego da expressão "argumentos arriscados".

Há muitos exemplos clássicos de argumentos arriscados. A teoria do Big Bang (sobre a origem do universo) é suportada por fatos experimentais (considerados, portanto, como verdades). No entanto, a teoria em si pode estar simplesmente errada (falsa).

Existem também evidências muito fortes de que o ato de fumar pode causar câncer. No entanto, a medicina ainda não respondeu à seguinte questão: as pessoas predispostas ao vício à nicotina são também predispostas ao câncer? Isso remete ao problema mais importante da medicina de hoje: causalidade. Ou seja, do ponto de vista indutivo, quais fatores podem ser definidos como as causas de determinadas doenças?

Quando uma pessoa atravessa uma rua, ela simplesmente aplica um argumento indutivo em seu processo de decisão. Não há como deduzir, sem risco algum, qual é o momento certo para atravessar uma rua sem ser atropelado.

O grande filósofo Charles Sanders Peirce (1839-1914) identificou ainda um segundo tipo de argumento de risco, o qual ele chamou de abdução. Mas este é um tema realmente complexo que prefiro discutir em algum outro momento.

Agora finalmente podemos responder (assim espero) às questões apresentadas pelo leitor Tiago Leski.

Na postagem sobre a ilusão da previsibilidade, levantamos a seguinte questão (de natureza muito comum em testes de QI): "Na sequência 01, 02, 03, 04, 05, 06, 07, 08, qual é o próximo número?"

Do ponto de vista meramente dedutivo (ou seja, sustentado em argumentos sem risco) não há como responder a esta questão, se apelarmos aos argumentos usuais discutidos na literatura especializada. E do ponto de vista indutivo (sustentado em argumentos de risco) qualquer resposta está sujeita a críticas.

É altamente questionável se testes de QI medem inteligência. Isso porque precisamos primeiramente qualificar o que, afinal de contas, é inteligência.

Se assumirmos que inteligência se reflete na forma de senso crítico, a pessoa mais inteligente provavelmente pegaria as folhas do teste de QI e as jogaria na lata de lixo mais próxima. Testes de QI, como inúmeras avaliações, medem a capacidade de adaptação pessoal àquele instrumento avaliativo. Se há alguma outra medição neste processo, é muito difícil responder. E especificamente os testes de QI, parecem meras tolices, justamente por ignorarem as discussões acima mencionadas.

O fato é que vivemos em um mundo complexo demais, habitado por criaturas primitivas demais, para garantir certezas sobre qualquer assunto.

Mais importante do que avaliar a inteligência de uma pessoa é perceber que vivemos em sociedade. Astrologia e eugenia já foram socialmente aceitas como ciência. Hoje não são.

Ou seja, existe uma intensa dinâmica social desde os primórdios da civilização. E o elemento dinâmico que melhor define os grandes avanços científicos, filosóficos, culturais e artísticos é a prática do senso crítico: sempre devemos questionar aquilo que se crê já estabelecido.

sexta-feira, 25 de janeiro de 2013

O Retorno de Doutor Fantástico



Esta é a segunda postagem sobre reações humanas, prometida dias atrás. A primeira tratou da reação da comunidade educacional brasileira em relação ao reconhecimento nacional do trabalho da Professora Vilma Ana Damborowiski. Esta reação é comparável à da personagem principal do conto The System of Doctor Tarr and Professor Fether, do extraordinário Edgar Allan Poe: surpreendentemente nula. Portanto, a comunidade educacional de nosso país carece de caráter.

Já neste texto temos uma resposta muito diferente a estímulos. E tal resposta veio do Colegiado do Curso de Física da Universidade Federal do Paraná (UFPR). Outros atores estão envolvidos nesta curiosa trama, incluindo duas instâncias superiores da UFPR. Mas as reações desses órgãos têm natureza muito diferente.

Para localizar o leitor rapidamente, relembro que no primeiro semestre letivo de 2012 lecionei cálculo diferencial e integral para duas turmas do Curso de Física da UFPR. Sustentado na obscena realidade do pacto REUNI/UFPR, decidi aplicar como critério de aprovação a simples assinatura dos alunos em cada uma das provas realizadas.

Graças a uma simples conversa com um aluno, foi possível convencer o Colegiado do Curso de Física a se manifestar em relação aos meus novos critérios de avaliação. Recebi então um primário ofício do Coordenador, ao qual rapidamente respondi

Em seguida o Coordenador, Professor Celso de Araújo Duarte, encaminhou novo ofício (144/2012) de quatro páginas para a Direção do Setor de Ciências Exatas. 

O novo documento apresenta uma redação bem melhor, se compararmos com o ofício 143/2012 que recebi. Isso por si só já foi um grande avanço. No entanto, o conteúdo é surpreendente a extremos.

Todos os documentos citados integram o processo 23075.046301/2012-53 que corre na UFPR.

Não reproduzo o ofício 144/2012 neste blog, para evitar cansativas redundâncias. Afinal, tal documento é desnecessariamente extenso. No entanto, a partir de minha resposta é possível resgatar as três acusações feitas contra mim.

Vale observar, porém, que na presente postagem já há algumas informações redundantes. Isso se deve à natureza burocrática do problema e adianto minhas sinceras desculpas ao leitor. 

Em função da tramitação do processo 23075.046301/2012-53, o Chefe do Departamento de Matemática gentilmente pediu para que eu redigisse uma carta a ser lida em plenária departamental. Fiz isso. Reproduzo abaixo minha carta, na qual respondo ao ofício 144/2012 da Coordenação do Curso de Física. 

Ao final desta postagem faço um breve relato sobre os eventos seguintes.
________


Curitiba, 10 de janeiro de 2013

Ao Professor Dr. Manuel Jesus Cruz Barreda
Chefe do Departamento de Matemática
Universidade Federal do Paraná

Sr. Chefe

Conforme solicitação verbal sua feita ontem, encaminho este documento para leitura em plenária departamental, com o propósito de prestar um breve histórico e esclarecimentos a respeito do Processo 23075.046301/2012-53.

HISTÓRICO

I) Durante o primeiro semestre letivo de 2012 lecionei para as turmas CM201-B e CM041-J do Curso de Física desta UFPR. 
Levando em consideração que:

1) A UFPR assinou o contrato REUNI com o Governo Federal, o qual estipula um aumento gradual de conclusão de curso para o índice de 90%;

2) O Setor de Ciências Exatas não se opôs ao REUNI, quando teve oportunidade;

3) Tenho considerável experiência no ensino de cálculo diferencial e integral e posso garantir (baseado em fatos) que, levando em conta o perfil dos alunos usualmente aceitos para o Curso de Física, não há meios lícitos para atingir o índice de aprovação de 90%;

4) Recuso-me a comprometer a qualidade de minhas aulas, apesar da exigência do contrato REUNI;

decidi adotar novos critérios de avaliação nas turmas acima citadas. 

Estabeleci com os alunos dessas turmas que: (i) todos aqueles que assinassem as duas avaliações escritas, realizadas durante o semestre letivo, seriam automaticamente aprovados com média mínima 50, independentemente das notas conquistadas em cada avaliação e (ii) os alunos que conquistassem média aritmética simples superior a 50, teriam suas médias fielmente registradas em seus respectivos boletins. 

II) Em novembro de 2012 recebi o ofício 143/2012 da Coordenação do Curso de Física, solicitando esclarecimentos sobre meus critérios de avaliação nas disciplinas CM201 e CM041. Imediatamente respondi o ofício, com cópia para a Chefia do Departamento de Matemática e para o Setor de Ciências Exatas. A essa altura o processo 23075.046301/2012-53 já estava aberto. 

III) O processo em questão tramitou do Setor de Ciências Exatas para a Pró-Reitoria de Gestão de Pessoas. A alegação da Direção do Setor foi que qualquer averiguação dos fatos deve exigir isenção e distanciamento. Em seguida o processo retornou ao Setor, sob a alegação de que se trata de assunto com cunho pedagógico e, portanto, deve ser discutido em plenária departamental. 

ESCLARECIMENTOS

Em um segundo ofício da Coordenação do Curso de Física (144/2012) para o Setor de Ciências Exatas, sou acusado de desobedecer o artigo 5.o da Constituição da República Federativa do Brasil, bem como o Estatuto e o Regimento Geral da Universidade Federal do Paraná. 

As duas primeiras acusações não procedem. Segundo o artigo 5.o da Constituição da República Federativa do Brasil, "Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza". O argumento da Coordenação do Curso de Física foi que "alguns [alunos] foram submetidos a processos avaliativos enquanto outros não". Tal argumento é lamentavelmente primário, uma vez que não posso obrigar todos os alunos a realizar avaliações. É uma situação muito comum esta, no Setor de Ciências Exatas. Alguns alunos se submetem a avaliações e outros simplesmente não comparecem para realizá-las. As mesmas oportunidades foram dadas a todos os alunos, sem discriminação alguma, incluindo o direito a segunda chamada. Portanto, jamais desobedeci a Constituição de nosso país.

A segunda acusação se refere à minha desobediência ao Artigo 2.o, Inciso I, do Estatuto da UFPR, segundo o qual a destinação da universidade é "promover a educação, o ensino e o desenvolvimento tecnológico e a cultura filosófica, científica, literária e artística". Sempre cumpri esta missão em minhas aulas. Se houver quaisquer dúvidas sobre esta questão, fortemente recomendo que o Coordenador do Curso de Física converse com todos os meus alunos, os quais ainda não se manifestaram oficialmente no processo em questão. Também convido qualquer professor interessado a assistir às minhas aulas, em caso de dúvidas.

A terceira acusação se refere à minha desobediência ao Regimento Geral da UFPR, principalmente no que se refere ao cálculo de médias e à realização de exame final. Isso é verdade. De fato violei o Regimento Geral da UFPR, simplesmente porque ele está em absoluta contradição com três fatos marcantes que não podem ser avaliados separadamente: o perfil acadêmico dos alunos do Curso de Física da UFPR, o caráter de disciplinas usualmente lecionadas no Setor de Ciências Exatas e as exigências do contrato REUNI que a UFPR assinou com o Governo Federal. Mesmo aprovando alunos que apenas assinaram suas avaliações, o índice de aprovação da turma CM041-J foi de 58% e o índice de aprovação da turma CM201-B foi de apenas 38%. Este resultado demonstra claramente a irresponsabilidade da Universidade Federal do Paraná em concordar com a meta de 90% de aprovação em todos os cursos. Na maioria das disciplinas obrigatórias dos cursos de graduação do Setor de Ciências Exatas esse índice é simplesmente impraticável. Por isso mesmo estudo maneiras de elevar ainda mais meus índices de aprovação em turmas que eu venha a assumir no futuro. Manterei os critérios de avaliação acima mencionados, ou variações dos mesmos, enquanto a UFPR não apresentar uma solução definitiva para a inconsistência entre o contrato REUNI e a realidade de nossa vida acadêmica. 

Minhas ações apontadas no processo em questão são uma simples consequência do compromisso da UFPR e do Setor de Ciências Exatas com o REUNI. Neste sentido, o que deve ser investigado é o pacto que a UFPR fez com o Governo Federal através do edital REUNI e não a minha conduta como professor.

Coloco-me à disposição para demais esclarecimentos a quaisquer interessados sobre o assunto.

Atenciosamente


Professor Adonai Sant'Anna
Departamento de Matemática  - UFPR
Matrícula 102806
___________

Decidi então aguardar pela reunião departamental, antes de divulgar aqui os novos fatos sobre o processo movido contra mim. Eu não queria interferir com quaisquer decisões da plenária. Afinal, já temos um "estranho jogo de pingue-pongue" neste processo, o qual nasceu na Coordenação do Curso de Física, foi encaminhado para a Direção do Setor, a qual jogou para a Pró-Reitoria de Gestão de Pessoas (PROGEPE) que, por sua vez, devolveu para o Departamento de Matemática. Ou seja, ninguém quer falar sobre o assunto, quando o tema é o REUNI. A PROGEPE simplesmente ignorou as graves acusações do Coordenador do Curso de Física, bem como a recomendação de encaminhamento feita pela Direção do Setor de Ciências Exatas.

Ontem finalmente ocorreu a 301.a Reunião do Departamento de Matemática, na qual um dos dois assuntos da pauta era o Processo 23075.046301/2012-53 movido contra mim. 

O relator foi o Professor Carlos Henrique dos Santos. Seu parecer foi contrário à formação de uma comissão de sindicância, conforme solicitado no processo 23075.046301/2012-53. O argumento foi sucinto. Uma comissão de sindicância deve apurar fatos. Como admiti violar o Regimento Geral da UFPR, não há mais fatos para serem apurados. 

A discussão em plenária durou cerca de uma hora e meia. Houve quem contestasse se realmente violei o Regimento Geral da UFPR, o qual é redigido de forma muito vaga. De minha parte, prefiro manter a posição de que fui contrário ao Regimento. Isso facilita a exposição da UFPR ao ridículo. 

Houve também duas manifestações contrárias aos meus critérios de aprovação, vindas de um professor e um aluno (este um representante discente que estranhamente apoia o REUNI). 

Ocorreram ainda discussões sobre a necessidade de uma nova redação para o Regimento da UFPR. E até mesmo um depoimento da Professora Soraya Rosana Torres Kudri teve lugar, o qual confesso ter me emocionado.

Considero que a decisão da plenária departamental foi sensata, ao aprovar o parecer do relator com pequenas modificações. Em nenhum momento o relator do processo discutiu sobre o REUNI. Não cabe ao Departamento de Matemática se indispor politicamente com a UFPR. E insisto neste ponto. Qualquer mudança política relevante nas universidades federais deve ocorrer de fora para dentro.

Conversei reservadamente com o Professor Carlos Henrique dos Santos, para saber sua opinião sobre o REUNI. Ele então me informou que havia encaminhado um documento para a UFPR no qual apontava os graves riscos deste contrato para a universidade. Pretendo em futuro próximo divulgar este importante documento, o qual foi simplesmente ignorado por instâncias superiores da UFPR. 

Infelizmente o processo 23075.046301/2012-53 parece estar fadado ao engavetamento. No entanto, muito em breve postarei um novo texto que será bem mais difícil de ignorar.

quarta-feira, 23 de janeiro de 2013

Realidade como uma Fábula



Em 2012 Ramon Voltolini (aluno da UniBrasil, em Curitiba, PR, e entusiasmado leitor deste blog) venceu o concurso Sangue Novo, na categoria de melhor reportagem impressa. Este prêmio é promovido pelo Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Paraná. Seu texto ressoa como uma fábula que utiliza elementos do mundo real para simbolizar algo que transcende a percepção imediata do cotidiano de uma escola. Pedi ao autor para divulgar seu inspirado texto neste blog e ele gentilmente permitiu. Desejo a todos uma ótima leitura.
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Às vezes é preciso sujar as mãos

Ramon Voltolini

7h30, segunda-feira.    “Professora, ele tá com o pé cheio de barro! O chão está todo sujo...”. Numa conduta criminosa, a professora ordena: “vá e varra esse teu rastro!”. De botas melecadas, a criança cerra os olhos, sai da sala e logo volta empunhando uma vassoura de palha. Cabisbaixo, começa a limpar aquela lama seca, encravada outrora nas suas sandálias. Mais rápido que o vai e vem dos braços pequenos somente o palpitar acelerado do seu peito. As bochechas estão coradas. O suor está vertendo. A sujeira finalmente se amontoa ao lado do cesto de lixo. O chão está limpo outra vez. O menino tem sete de idade. 

Há três anos, mandar um aluno do fundamental varrer sua sujeira e acordar um ou outro dorminhoco debruçado sobre a carteira eram práticas corriqueiras de algumas educadoras da Escola Municipal Madalena Portella, de Campo Largo. Até 2001, dar banhos em crianças encardidas, lavar seus uniformes e conduzir as que, por ventura, passassem mal ao pronto socorro também fazia parte do dia a dia dos professores. A maioria dos pais só sabia das duchas e curativos depois que o filho chegava em casa cheiroso, com um esparadrapo por cima da ferida. A escola está localizada em um dos bairros nobres da cidade, no Ouro Verde. Entretanto, 70% dos 375 matriculados no ensino fundamental moram na área rural (Ferraria, Felpudo e Retiro) da Capital da Louça.

Fevereiro, 2008. Dos 27 alunos, apenas 15 estão na sala. O dia amanheceu escuro. Ainda chove. Com mais essa falta, os ausentes reprovam por não cumprirem os 75% de frequência estabelecidos pelo Plano Nacional de Educação (PNE). As professoras, impacientes, relutam à orientação da secretária Arlei Remonato: assinalar as faltas a lápis. Nesse momento, mas a 30 km da escola, as crianças faltantes estão de olhos grudados nas janelas embaçadas do ônibus escolar, que balança feito um barco enquanto tenta atravessar a correnteza brava do rio do Felpudo. Impossível. O ônibus encalha. Depois de duas horas, finalmente a água baixa. Os alunos voltam para suas casas. Além da bronca, um bilhete na agenda aguarda as crianças no próximo dia ensolarado de aula.

Com a entrada da pedagoga Maria Alice há três anos na escola, uma proposta inédita foi feita aos professores: visitar os estudantes e descobrir os motivos das faltas frequentes, da sujeira nos uniformes, do sono inesgotável das crianças. “Nós saímos atrás do ônibus às 12h15. Chegamos às 13h45 no ‘centro’ do Felpudo. Encontramos os alunos no meio do carreiro e ainda faltava chão para o trajeto terminar”, conta Fabiana Rigoni, na época professora da 4ª série e hoje auxiliar de administração da Madalena Portella. “Foi ali que caiu a minha ficha. A partir desse dia, decidi mudar minha postura dentro de sala”, declara. Terezinha, diretora da escola, compunha o trio que em 2008 decidiu seguir, conhecer, os passos das crianças. “Tinha comprado meu carro há três meses, zero. Lá fomos nós. Atrás do ônibus, por estradas de chão. Até cruzamos um rio, acredita?!”. 

Abril, 2008. “Mãe, mãe! A diretora tá aqui! Preciso arrumar meu cabelo!”, grita a menina ao ver o carro de Terezinha parado em frente à sua casa, erguida sobre um campo verde cheio de árvores que contrasta com a rua amarelada de pó. A visita não fora agendada. As educadoras mal conhecem os pais dos alunos. “Já sei! Vamos perguntar sobre os causos desses lugares!”, sugere Maria Alice. A única formalidade é a apresentação das educadoras, seguida de um aperto de mão. Logo estão as professoras, a diretora, a aluna e sua mãe em volta da mesa da cozinha. A bacia com bolinhos de arroz fritos na hora tempera a conversa sobre lobisomens, boitatás, chupa-cabras. “Acordamos às 5h pra ir pegar o ônibus. Se chove, ele encalha naquele rio que vocês cruzaram”, conta a aluna. Pela janela, Fabiana vê crianças brincando. Elas estão correndo, subindo em árvores; todas vestindo os uniformes da escola. “Então é assim que eles encardem as roupas com gordura; a mãe faz frituras na hora do almoço. O sono se justifica. O pó vem daí, do pega-pega jogado em cima do gramado”, pensa. 

Nessa última década, e após passar por três gestões administrativas distintas, a postura da Escola Municipal Madalena Portella frente à aparente displicência dos alunos do fundamental tem sofrido diversas mudanças. De ações imediatistas com efeitos efêmeros (banho num dia e curativo noutro), o corpo docente chefia, hoje, três projetos contínuos baseados no cotidiano das crianças: o “Caminhos da Minha Escola (projeto que trabalha as características geográficas da área rural de Campo Largo); o “Coral da E.M.M.P (conjunto formado por alunos e seus pais que canta clássicos do sertanejo de raiz)” e o “Contos e Causos (histórias contadas e escritas por alunos publicadas em jornal da cidade)”. 

Novembro, 2011. “Mas deixe eu te contar que tapada que eu era...”, anuncia Fabiana Rigoni antes de começar seu depoimento. A sala, branca e fechada, reverbera cada palavra dita. Uma câmera registra todos os detalhes da história, toda sinceridade contida na fala. “Se o coleguinha visse o pé do outro cheio de barro, ele me avisava e eu – olhe que crime que eu cometia enquanto educadora! – mandava o menino varrer a sujeira!”, confessa Fabiana com um sorriso envergonhado no rosto. “Hoje eles [professores] entendem quando eu falto”, sussurra um dos alunos do fundamental no pátio da escola. “A gente faz maquete, conta história, escreve sobre a nossa casa”, explicam duas meninas da 4º série durante o recreio do período matutino da Madalena. “Até hoje estou à procura desse menino que varreu o chão. No dia em que visitamos o Felpudo, pedi desculpas aos alunos que encontrei no caminho pelos ‘crimes’ cometidos por mim dentro da escola. Não encontrei ele [menino das sandálias sujas] ainda. Preciso me desculpar”, desabafa, com os olhos cerrados de lágrimas, a professora que hoje coordena os três projetos de inclusão da escola. “A gente conheceu a realidade deles. Nos sujamos com o pó da rua e com a gordura dos bolinhos. Só assim entendemos nossos alunos”.

segunda-feira, 21 de janeiro de 2013

Fazer pesquisa não é tão difícil assim



Atividades de ensino em uma universidade federal implicam em uma carga horária mínima de oito horas/aula semanais e máxima de doze, sendo que pelo menos metade dela deve ser destinada a cursos de graduação. As demais horas semanais, no caso de um professor com contrato de Dedicação Exclusiva, têm que ser distribuídas entre pesquisa e extensão, além de preparação de aulas, avaliações e atendimento a alunos. É claro que o docente pode eventualmente assumir um cargo administrativo, desde simples representação em colegiados de cursos até Reitor. Dependendo do cargo, o professor não é obrigado a lecionar. O curioso é que não existem atividades de pesquisa que dispensem um docente de suas atribuições de ensino na graduação, a não ser no caso de afastamentos para visitações científicas em outras instituições (como nos casos de realização de doutorado e pós-doutorado). Isso demonstra que a atividade administrativa nas universidades federais têm um status completamente diferenciado em relação à pesquisa. Alguns docentes chegam a pensar que atividades administrativas são um privilégio. Afinal administração pode demandar tempo o bastante para impedir um professor de lecionar. E existem muitos professores nas universidades federais que não gostam de lecionar. Portanto, pesquisa não é tão exigente assim.

A pesquisa e a extensão são exercícios profissionais que têm sido discutidos ao longo de múltiplas eras burocráticas. Dependendo da área de atuação de um docente, os critérios que burocraticamente definem pesquisa podem mudar de forma significativa. Entre matemáticos, por exemplo, o critério mais usado é o de publicações. Se o docente publica frequente e consistentemente em periódicos especializados indexados, de circulação internacional, com corpo editorial, sistema de referees (avaliadores) e bom fator de impacto, ele pode se caracterizar como um pesquisador. Além disso, diante da atual realidade brasileira, tem se exigido cada vez mais que o pesquisador seja membro de algum grupo de pesquisa credenciado no CNPq. Já em educação matemática, pelo menos em nosso país, essas exigências comumente não fazem muito sentido. Um professor pode ficar caracterizado como pesquisador em educação matemática se ele simplesmente participar de congressos nacionais e regionais, publicando apenas resumos ou artigos em volumes de anais de eventos com circulação insípida ou em periódicos de circulação regional ou nacional. Até mesmo publicações de artigos em jornais não especializados, como a Folha de São Paulo, contam pontos de produtividade. Pesquisadores em educação matemática vivem uma realidade muito menos exigente do que aquela dos pesquisadores em matemática. Muitos deles chegam até mesmo a achar que um periódico é indexado quando tem ISSN, o que é realmente tragicômico. E esta é uma dolorosa realidade, mesmo em uma época na qual existem importantes periódicos internacionais de educação matemática. 

Já o conceito de administração nas universidades federais é bem menos polêmico. Se o docente assume uma função gratificada ou um cargo de confiança, pode diminuir consideravelmente seus encargos didáticos ou até mesmo abrir mão deles, independentemente da qualidade de seu trabalho. Como a autonomia das universidades federais não existe na prática, mas apenas no papel, as decisões administrativas se resumem a decisões da seguinte natureza:

(i) Devemos lotar nossos docentes em departamentos ou coordenações? 

(ii) Devemos dividir administrativamente a universidade em setores ou institutos?

(iii) Devemos eleger o Reitor por lista tríplice ou eleições diretas?

(iv) Devemos distribuir as novas vagas docentes dadas pelo Governo Federal por pedidos de balcão e negociações ou por critérios técnicos? 

(v) Devemos conceder o pedido de afastamento daquele professor ou negar?

Ou seja, a autonomia administrativa universitária se refere, na prática, a questões de pouca relevância para a qualidade das atividades acadêmicas. Uma instituição que não tem autonomia para demitir, contratar ou negociar salários e atividades só pode contar com a boa vontade de seus membros. Uma instituição que não tem autonomia para negociar salários ou cargos, não tem condições de oferecer vantagens aos mais produtivos. Uma universidade que não tem autonomia para preencher vagas congeladas (por decorrência de falecimentos, aposentadorias ou exonerações de cargo) por burocratas de Brasília encontra sérias dificuldades para atender às suas demandas locais. Uma universidade que não tem autonomia para usar critérios mais justos de seleção de alunos do que o insano vestibular é uma instituição intelectualmente morta. As universidades federais vivem a frustração da falta de autonomia, a qual impossibilita a concepção e  manutenção de políticas acadêmicas bem definidas e que tenham relevância significativa para a sociedade.

No entanto, essas mesmas universidades aceitam com tranquilidade o fato de que administração é uma atividade mais exigente do que pesquisa. Portanto, se algum dia as universidades federais conquistarem autonomia real, certamente não poderão manter a maioria dos professores hoje existentes em seus quadros docentes. Caso contrário, teremos uma realidade acadêmica brasileira muito mais presente em reuniões sem sentido do que em seminários de pesquisa. 

Lembro quando Antonio José de Nardi foi Diretor do Setor de Ciências Exatas na Universidade Federal do Paraná, em meados dos anos 1990. Ele nunca teve o perfil de pesquisador. No entanto, sempre apoiou grupos de pesquisa. Quando assumiu seu cargo na Direção do Setor, percebeu que seu escritório era grande demais e decidiu transformar aquela imensa sala em duas. Uma seria usada por ele e a outra seria destinada à realização de seminários de pesquisa. 

Anos depois, em uma reunião do Conselho Setorial realizada neste mesmo ambiente destinado prioritariamente a seminários, uma professora recomendou que aquela sala deveria ser utilizada única e exclusivamente para reuniões administrativas. Curiosamente todos os demais membros do Conselho se calaram, reprovando silenciosamente esta absurda ideia. 

No entanto, se algum dia as universidades federais conquistarem a tão sonhada autonomia, muitas questões de extrema relevância deverão ser discutidas. Isso necessariamente implica em mais reuniões. E em um ambiente que já aceita com naturalidade que administração insípida exige mais empenho do que pesquisa, qual será o espaço reservado aos grupos que tentam alavancar o conhecimento científico?

Sem desenvolvimento científico, universidades se transformam em meras repetidoras de conhecimentos registrados em livros. 

O ensino superior público brasileiro, principalmente nas universidades federais, é um sistema que não funciona mais. Precisa ser reconstruído, sob novos princípios e com nova gente.

sábado, 19 de janeiro de 2013

Antagonizando BP Fallon


O jornalista Ignácio de Loyola Brandão, ex-bolsista Fulbright e ganhador do Prêmio Jabuti de literatura, foi um dos membros da comissão julgadora que elegeu Vilma Ana Damborowiski como a melhor professora de matemática do Brasil em 2001. Durante a cerimônia ele fez questão de cumprimentar a Professora Vilma, pela excepcional qualidade de seu trabalho.

Hoje esta docente trabalha em uma ilha, na costa paranaense. Parece simbolismo de produção cinematográfica de Hollywood, mas é a dolorosa realidade. Ela trabalha em uma ilha simplesmente porque no continente seu trabalho não é bem-vindo nem mesmo em instituições privadas (as quais deveriam operar por meritocracia, mas simplesmente não o fazem).

Nas últimas 24 horas recebi dezenas de mensagens e e-mails, em reação à postagem sobre a Professora Vilma. Uma leitora deste blog escreveu nada menos do que oito comentários neste fórum. Mas, infelizmente, não posso publicá-los, a pedido dela mesma. Essa leitora, também professora, percebeu que pode sofrer represálias pessoais e profissionais e solicitou que eu não veiculasse seus comentários. Obviamente respeitei o desejo dela, mas ainda assim posso expor um pouco do que ela informou:

1) Com o argumento de que crianças e adolescentes não podem ficar fora da escola, autoridades exigem que os professores tolerem faltas não justificadas, indisciplina e violência.

2) Os pais querem seus filhos na escola não para fins de estudos, mas para não terem problemas em casa.

3) As condições de trabalho de professores estaduais são insalubres e estão destruindo a saúde de inúmeros profissionais.

4) A situação do ensino público no Rio de Janeiro e em Santa Catarina é idêntica àquela relatada pela Professora Vilma no estado do Paraná.

Muito mais informações foram dadas, mas não vou divulgá-las, para evitar a identificação desta profissional.

Quando publiquei o depoimento da Professora Vilma, confesso que fiquei realmente perturbado. Isso porque lembrei de outras postagens recentemente veiculadas neste blog. E cheguei à seguinte conclusão:

Ao inferno com os professores que acumulam cargos nas mesmas universidades federais, apenas para receberem salários equivalentes à dedicação exclusiva sem se submeterem às exigências deste tipo de contrato!

Ao inferno com aqueles que tentam desesperadamente se agarrar a leituras ridículas da Constituição Federal para justificar seus indecentes acúmulos de cargos!

Ao inferno com os amorais e medíocres que compram trabalhos acadêmicos!

Ao inferno com os oportunistas miseráveis que vendem trabalhos acadêmicos!

Ao inferno com aqueles que apoiam o REUNI!

Ao inferno com aqueles que apoiam o ENEM!

Ao inferno com aqueles que querem se acomodar com a estabilidade no serviço público!

Ao inferno com aqueles que apoiam os programas de cotas raciais e sociais!

Ao inferno com os incompetentes que inundam as cabeças de nossos jovens com conceitos mentirosos sobre matemática e ciência!

Ao inferno com os lobistas que vestem peles de educadores!

Ao inferno com o silêncio daqueles que deveriam criticar duramente a  educação!

Ao inferno com os professores que não querem aprender a avaliar seus alunos!

Ao inferno com aqueles que defendem o desrespeito à propriedade intelectual!

Ao inferno com aqueles que praticam a pirataria, julgando que não fazem mal algum!

Ao inferno com os pais que não cultivam a educação, a ciência e a cultura em seus filhos!

Ao inferno com o descaso aos superdotados!

Ao inferno com o descaso aos pesquisadores de talento!

Ao inferno com aqueles que não cultivam o patriotismo em seus corações!

Ao inferno com os incivilizados!

Mas, principalmente, ao inferno com os indiferentes! Esses deveriam ser simplesmente largados em uma ilha, longe das sociedades que lutam pelo progresso.

Para aqueles que acreditam na salvação (real e não por suposta intervenção divina), espero que façam algo realmente concreto a respeito. Este país não pode continuar como está.

sexta-feira, 18 de janeiro de 2013

A Realidade de Hoje da Melhor Professora de Matemática do Brasil



Lembram quando prometi postagens sobre extraordinárias reações humanas? Pois bem. Esta é a primeira. A segunda será veiculada em breve.

Em 2001 Vilma Ana Damborowiski (na época, Vilma Ana Schlup Sant'Anna) foi eleita, pela Fundação Victor Civita, a melhor professora de matemática do país. Era o Prêmio Professor Nota 10, hoje conhecido como Prêmio Educador Nota 10. A entrega da honraria foi em um teatro lotado, contando com a participação de autoridades e celebridades, incluindo o então Ministro da Educação Paulo Renato Souza. O evento foi transmitido por televisão e divulgado na revista Veja, entre outras mídias. 

Se o Brasil fosse um país sério, a Professora Vilma estaria hoje exercendo atividades educacionais e políticas que poderiam mudar significativamente a horrível situação de nossa educação básica em âmbito nacional. No entanto, passada a febre do momento, a realidade que ela vive hoje é a mesma insana luta da maioria esmagadora dos docentes desta miserável nação: educar em um ambiente que não entende o que é educação. 

Acompanhem a seguir o depoimento da Professora Vilma. 


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Fui convidada pelo Professor Adonai Sant'Anna para contar um pouco da minha vida profissional. Espero que este relato possa ser útil e que, de alguma forma, contribua com a educação de nossas crianças.

Sou professora de matemática há vinte anos e já tive bons e maus momentos no magistério. Fiz licenciatura na Universidade Federal do Paraná e alguns cursos posteriormente. Porém, nada se compara com a formação que adquiro dentro das salas de aula, trabalhando com os alunos. 

Conheço a realidade das escolas particulares e do ensino público. Trabalhei com a educação de jovens e adultos e também com ensino superior. Já lecionei física, química, desenho geométrico e matemática, a qual pode englobar (dependendo de como é trabalhada) muitas disciplinas. Sempre gostei de ensinar. Quando criança, a minha brincadeira preferida era de escolinha. E eu adorava ajudar meus irmãos nas tarefas escolares.

Acredito que o fato mais marcante na minha vida profissional tenha sido o Prêmio Professor Nota 10, que recebi da Fundação Victor Civita no ano de 2001. Foram 3741 trabalhos inscritos e, além do prêmio, recebi críticas extremamente positivas e incentivadoras. Nessa época eu trabalhava no Colégio Martinus Júnior (Curitiba, PR) e a metodologia que aplicávamos era o construtivismo e o ensino pela pesquisa. A nossa ideia era fugir de um ensino sem significado. 

Para desenvolver os conteúdos partíamos de uma situação-problema e frequentemente acabávamos na elaboração de um projeto. O meu objetivo, no momento, era ensinar a operação de divisão para uma turma de sexto ano, antiga quinta série. Contudo, não poderia utilizar apenas listas de exercícios e atividades mecânicas. Os alunos deveriam ter um objetivo maior. 

Neste caso, estabelecemos que deveríamos descobrir por que a professora de geografia fazia comparações como: "Se considerarmos o tamanho da Terra como o tamanho de uma laranja, Plutão terá o tamanho de uma semente de mostarda". 

A situação-problema estava escrita no quadro, pela professora de geografia. Em seguida começamos os questionamentos com os alunos. Hipóteses foram levantadas e, em pouco tempo, estávamos trabalhando com proporções, escalas, miniaturas, intermináveis divisões, transformações de unidades, noções de geometria e médias. As médias apareceram porque nós precisávamos dos raios dos planetas. Tínhamos cinco livros de geografia e, consequentemente, cinco raios diferentes para cada planeta. Este trabalho foi realmente memorável. Lembrar-me dessa época aquece meu coração e fico esperançosa em relação ao futuro. O trabalho que desenvolvíamos nessa escola era inovador. Mas os resultados não eram tão imediatos. Recebíamos críticas severas e, muitas vezes, ouvi que eu apenas brincava com os meus alunos. Convencer os pais dos alunos, acostumados ao ensino tradicional, era realmente um desafio. Esse prêmio foi um marco e, a partir daí, as minhas dúvidas se transformaram em certezas. Não mudei a minha forma de pensar, porém adquiri maior segurança. 

Hoje trabalho em uma escola estadual e o perfil dos meus alunos não é diferente do que tenho visto por aí. Continua sendo um desafio diário preparar aulas que sejam motivadoras e fazer com que os alunos percebam a diferença do futuro que podem ter com uma boa educação. Ainda sou da opinião de que, quanto mais investimentos forem feitos na educação, menos presídios deverão ser construídos.

Percebo que a escola sempre teve um papel importante. Porém, hoje o seu papel é fundamental em nossa sociedade. Estou vendo que as famílias estão se desagregando e deixando a cargo dos professores a educação das crianças. Tenho dúvidas se a escola está conseguindo desempenhar bem, mais essa função. 

No último dia de aula de 2012, nas proximidades da escola onde leciono, houve um velório. Não é uma situação agradável. Mas é a lei natural da vida. Assim que cheguei, os alunos vieram me contar que quem estava sendo velado era um rapaz de vinte e cinco anos, morto por dívidas com o tráfico de drogas e um ex-aluno do nosso colégio. Fiquei atordoada. Há poucos anos aquele jovem frequentava a mesma escola onde estávamos, brincava no pátio e deveria ter sonhos, como as crianças que falavam animadamente comigo naquele instante. Quando foi que o perdemos? Onde falhamos? Qual teorema estávamos ocupados em demonstrar quando não percebemos o momento em que esse garoto decidiu fugir da realidade e mergulhar no mundo das drogas?

Leciono na única escola de ensino fundamental e médio de uma ilha com vinte mil habitantes. Essa quantidade é maior do que a população de alguns municípios. A escola possui em torno de dois mil alunos, quatro turnos diários, em média quarenta alunos por turma, com um intervalo de dez minutos entre um turno e outro, o que não permite prévia limpeza das salas de aula. As salas são de madeira e não puderam ser demolidas, pela grande quantidade de alunos. Não há quadra coberta. Na região do litoral o sol é muito intenso e o calor é insuportável. As salas possuem apenas dois ventiladores, que nem sempre estão funcionando. É necessário que se faça algo? Acredito que sim. Porém, o que ouvimos de nossas autoridades: "A situação é temporária". Há cinco anos essa comunidade espera a construção de uma nova escola.

Além de todas essas adversidades, ainda precisamos analisar que tipo de educação as crianças recebem nos seus lares. Muitos alunos, principalmente os adolescentes, não possuem limites. Simplesmente agem livremente, sem seguir normas ou regras. Muitos desafiam apenas para tumultuar a aula e testar o limite do professor. Parece que o objetivo maior é interferir na aprendizagem dos colegas, como um despeito: "Se não consigo aprender, meu colega também não aprenderá." 

No início de 2012, em uma turma de nono ano com quarenta e dois alunos, um deles se recusou a fazer as atividades que propus. Pedi que fizesse a tarefa. Perguntei-lhe se possuía dúvidas. Mas o indivíduo queria conversar com os colegas. Então, decepcionada, solicitei que o mesmo saísse da aula e fosse para a Coordenação. Depois de muitos palavrões e insultos dirigidos a mim e à minha mãe, retirou-se da sala. Eu poderia ter acionado o Conselho Tutelar. Porém, decidi primeiro falar com a família do garoto. Quase que por um milagre, a mãe do aluno apareceu depois de alguns dias e justificou o comportamento do filho, dizendo que ele vivia com a avó, e era assim mesmo, não respeitava ninguém. Respondi-lhe que aquele comportamento era inaceitável e que, da próxima vez, eu tomaria outras providências. Depois deste fato, o menino passou a frequentar as aulas, evitava conversar e teve rendimento razoável. 

Outro fato marcante aconteceu em 2010, quando chamei a atenção de um aluno de dezesseis anos, que estava na quinta série. O garoto respondeu-me instantaneamente: "Você está muito corajosa hoje. Sei onde você mora." Estupefata, eu lhe disse que conhecia os meus direitos e, se alguma coisa acontecesse comigo, ele seria responsabilizado. 

Analisando esses episódios e alguns outros parecidos, pergunto como faremos diferença na vida desses jovens, que não possuem limites, que são revoltados, que possuem baixa autoestima, que aprendem com os próprios pais a menosprezar a educação, ignoram o caminho natural para abrirem seus horizontes e conquistarem uma vida melhor.

Discutimos o rendimento dos universitários brasileiros. Mas talvez o foco deva ser como o aluno está saindo do ensino fundamental e médio. Hoje, no ensino básico, o rendimento dos alunos é muito facilitado. Todo mês o estudante deve fazer uma prova de recuperação no valor de cinco pontos, além de, no mínimo, três avaliações diferentes. As tarefas de casa já foram abandonadas, por muitos professores, porque, mesmo fazendo a verificação diária, muitos alunos apenas copiam ou respondem de qualquer forma e a atividade que traria a sedimentação dos conteúdos perde simplesmente a utilidade. 

Falta a conscientização dos pais, que devem fazer um acompanhamento diário das tarefas escolares dos seus filhos. Até 2012, aqui no Paraná, tínhamos quatro aulas semanais de matemática no ensino fundamental, com pelo menos quatro avaliações mensais, com uma média de cento e sessenta provas por turma, resultando em seiscentas e quarenta avaliações para serem corrigidas em cada período de vinte horas. E uma questão adicional: a maioria dos professores precisa trabalhar em dois períodos. Logo, cerca de mil e duzentas e oitenta provas, para serem corrigidas mensalmente! O professor está virando máquina e, mesmo querendo fazer um trabalho criativo ou motivador, o tempo é exíguo, causando falta de qualidade no ensino e uma  aprendizagem apenas superficial. 

A escola, muitas vezes, deixa de cumprir a sua função primordial de mudar os valores dos nossos alunos. Todo ano é a mesma rotina. Começo sempre pelo ensino da tabuada. E, para garantir, eu a entrego digitada em papel cartão. Isso porque sei, com antecedência, que a mesma não será decorada e não será possível seguir adiante. Como ensinar, por exemplo, cálculo de potência, se o aluno desconhece a multiplicação? A esperança é que, durante o ano, se utilize tantas vezes a tabuada, que os alunos acabem por assimilá-la. 

Este é apenas um exemplo. É claro que se um aluno não domina algum conteúdo devemos resgatá-lo. Só que, enquanto resgato conteúdos, deixo de apresentar os conteúdos da série. E, no próximo ano, esse mesmo indivíduo terá as mesmas dificuldades e assim sucessivamente. 

Sou uma professora apaixonada pela educação e pelos meus alunos. Acredito que não existe fórmula mágica, mas tem jeito. É investimento a médio e longo prazo. Se não nos unirmos para mudar esse quadro, não precisaremos investir recursos nas universidades e sim em presídios e cemitérios.