sábado, 3 de março de 2012
Matemática elementar desacreditando paranormalidade
Apesar de ser um episódio bem conhecido na literatura, percebo que muitas pessoas ainda ignoram o caso de Emily Rosa, o qual é inspirador sob diversos pontos de vista.
Como atividade para a feira de ciências da quarta série, Emily Rosa apresentou resultados de uma pesquisa que realizou aos nove anos de idade (em 1996) e posteriormente publicou no Journal of the American Medical Association, a convite do próprio editor, George Lundberg.
Rosa não demonstra ser um gênio precoce. E ainda assim se tornou a pessoa mais jovem a publicar um artigo científico em um periódico de medicina, deixando claro que ciência de boa qualidade nem sempre exige o domínio de conhecimentos científicos avançados.
A principal ferramenta dela foi o emprego adequado de noções elementares de teoria de probabilidades, algo que aquela garota parecia conhecer melhor do que a maioria de nossos professores de matemática.
Rosa queria saber se há suporte racional para a alegação de certas pessoas de que são capazes de sentir o "campo energético humano". Em várias partes do mundo (talvez em todos os países) existe a prática do diagnóstico e cura de doenças através das mãos. Entre essas pessoas há, inclusive, enfermeiras que trabalham em hospitais. Especificamente os praticantes do chamado toque terapêutico alegam que sequer precisam encostar nas mãos do enfermo, pois sentem o tal do campo energético a pequenas distâncias. E esse campo energético é percebido em qualquer pessoa, seja enferma ou sadia.
O aparato de teste da garota de nove anos era simples. Sobre uma mesa foi colocada uma tela (para impedir contato visual entre sujeito de teste e Rosa), com dois orifícios na parte de baixo. De um lado da mesa estava sentada Rosa. Do outro, o praticante de toque terapêutico. Este colocava suas mãos nos orifícios, com as palmas para cima. Rosa jogava uma moeda, para decidir sobre qual das mãos do praticante ela colocaria a sua. Em seguida, finalmente aproximava a mão daquela determinada ao acaso pela moeda e perguntava ao praticante em qual das mãos ele sentia o campo energético de Rosa. Dezenas desses praticantes foram testados em várias ocasiões. Mas todos os índices de acerto podem ser explicados a partir de mero acaso. Ou seja, não há fundamentação ou justificativa que suporte a percepção do campo energético humano. Consequentemente, não há apoio racional também para a cura pelo toque.
Algo semelhante já foi feito com estudos sobre a eficácia da homeopatia, a qual comumente encontra casos de curas que se enquadram nas mesmas estatísticas de efeito placebo.
O impacto do trabalho de Rosa foi imenso, sendo citado em mídias como Nature, Discovery Channel, New York Times e até no site imdb (especializado em cinema).
O que podemos aprender com este caso?
1) Ciência de qualidade é uma atividade cultural ao alcance de qualquer interessado. Por isso, rogo aos professores que citem este caso para seus pupilos. É uma apaixonante forma de estímulo.
2) Ainda existem questões fundamentais que não foram respondidas pela ciência simplesmente porque não há gente trabalhando nelas. Há muito mais dúvidas não respondidas pela ciência do que cientistas ou pesquisadores em busca de respostas.
3) Ciência é fundamental para avaliar de maneira sensata crenças populares em mediunidade, telepatia, precognição, telecinesia, vida após a morte, contatos com extraterrestres, homeopatia, medicina ortomolecular, programação neurolinguística, visões divinas, astrologia e demais modismos culturais do momento.
4) A comunidade científica deve sair do casulo no qual frequentemente se trancafia e abrir os olhos para talentos nos lugares mais inesperados. Ciência não se faz apenas em um laboratório ou escritório. Universidades e centros de pesquisa devem estender sua influência para a sociedade como um todo. Afinal, se não fosse pela iniciativa de Lundberg, o trabalho de Rosa teria se resumido a algo apenas bonitinho para familiares e amigos.
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Esta história é muito bela e interessante. Um estímulo aos alunos e aos professores, que devem promover mais feiras de ciência. Canais abertos para mentes questionadoras! Obrigada de novo, Adonai !
ResponderExcluirPois é, Susan
ResponderExcluirDurante meu tempo de ensino fundamental e médio, todas as escolas públicas faziam feiras de ciências. Havia também o FEMUCI (Feira Municipal de Ciências). Foi lá que apresentei o trabalho que discuto em http://adonaisantanna.blogspot.com/2012/01/matematica-e-historia-um-exemplo-de.html
A FEMUCI acontecia no Parque Barigui. Depois, por conta do valor excessivo do aluguel daqueles galpões, essa feira não teve mais continuidade.
Olá, prof. Adonai!!!!
ResponderExcluirParabéns, pela postagem a qual, eu confesso que não tinha lido ou ouvido falar!!!! Ela nos faz pensar a respeito, de qual ferramenta e como devemos usá-la, para avaliarmos até coisas como forças poderosas e antes, difíceis de serem avaliadas por serem etéreas, misteriosas e/ou sobrenaturais!!!! Para realizar isso, basta o conhecimento científico, a coragem e a curiosidade feito uma criança!!!!
Fiquei curioso, ao notar que em suas conclusões sobre a sua postagem, o sr. destacou o assunto... "contatos com extraterrestres". Posso lhe fazer uma pergunta: Por que?
Já militei em um grupo de estudos sobre os OVNIS e a conclusão que tirei? Manipulação de espertos, principalmente da mídia escrita, para alavancarem as vendas de revistas, livros, e periódicos!!!!
Um abraço!!!!!
Francisco Valdir
ExcluirDestaquei contatos extraterrestre por dois motivos. 1) Estudei muito a respeito do tema, principalmente em periódicos de psiquiatria e de psicanálise. Comumente pessoas que alegam terem sido sequestradas por seres de outros mundos não estão mentindo. Elas genuinamente acreditam nisso. Isso tem dado tema para muita pesquisa sobre traumas, principalmente sexuais. Um dos relatos mais comuns é o de que pessoas que foram sexualmente molestadas por familiares criam inconscientemente a fantasia da abdução extraterrestre como mecanismo de defesa. É mais fácil acreditar que um ser de outro planeta tenha feito aquelas atrocidades do que o pai ou o irmão. 2) Fiz link com um conto que escrevi tempos atrás sobre o tema.
Muito interessante!
ResponderExcluirelementosdeteixeira.blogspot.com
Aloisio
ExcluirGrato pela dica. Dei uma olhada superficial no seu blog e gostei. Posteriormente examinarei com mais cuidado.
Então... da minha infância lembro que faziamos no Instituto de Educação aquelas coisinhas simples de pulmões de garrafas e bexigas, etc. mas nada tão maravilhoso. No mais, lembrei que o Parque Castelo Branco foi transformado em um parque da ciência, não? Ele ainda existe? faz alguma coisa? promove ciência? ou é apenas uma espécie de "museu" que limita novas experiências? Alguém sabe me dizer? Poderíamos fazer campanhas para melhorar ou reabrir (caso esteja fechado - o que não me surpreenderia).
ResponderExcluirSusan
ExcluirLembro que Roberto Requião queria acabar com o parque de ciência no Parque Castelo Branco. Ele alegava que o lugar era para gado e não ciência. Hoje não sei como estão as atividades por lá. Agradeceria se alguém informasse por aqui.
"Ciência é fundamental para avaliar de maneira sensata crenças populares em [...] vida após a morte, [...] visões divinas ... e demais modismos culturais do momento".
ResponderExcluirVocê é ateu? Por que?
AAnooniimoo
AAnooniimoo
ExcluirNão vejo como se possa suspeitar que eu seja ateu, a partir de meu texto. Veja que discuto sobre avaliação de crenças populares. Há crenças populares que se verificam verdadeiras (em algum sentido) e existem aquelas que se mostram falsas. O que defendo é um tratamento racional sobre informações que nos são apresentadas.
Já eu não vejo como eu não possa suspeitar disso! Motivo: o sr. chama "vida após a morte" e "visões divinas" de modismo cultural, logo tenho certeza de que o sr. não é um crente literal da Bíblia (o que na minha opinião diminui a probabilidade do sr. ser teísta). Note que não estou excluindo a possibilidade do sr. ser muçulmano, budista ou idolatrar qualquer tipo de deus; só estou considerando improvável e é essa improbabilidade (que é suposição minha) aumenta minha suspeita.
ExcluirPor outro lado vejo, bem nitidamente, que o sr. não respondeu minha pergunta assim como não o fez a seu aluno "após citar Bertrand Russell em sala de aula" [vide post "Histórias que posso contar"].
Também é possível que o sr. seja algum tipo de agnóstico... Na verdade pelo fragmento "o que defendo é um tratamento racional sobre informações que nos são apresentadas" e pela sua postura científica passo a suspeitar que o sr. nem crê e nem descrê - por falta de argumentos racionais passíveis de prova (que não existem e nem jamais existirão).
Sabe o que eu acho sobre religião? Que é como a matemática. Cada doutrina é, na verdade, um teorema construído a partir de axiomas sendo que cada religião adota um conjunto de axiomas. Por exemplo, um axioma no qual eu acredito é que Deus existe. Daí tomando o conjunto de axiomas nos quais eu acredito eu posso construir todas as doutrinas da religião que eu sigo. Não vejo porque isso é mais irracional do que acreditar no fato de que conjuntos existem. Ambas as coisas requerem fé (o que distingue uma da outra é a finalidade de cada uma das crenças e não a sua natureza).
AAnooniimoo
AAnooniimoo
ExcluirRealmente não vejo relevância nesta questão diante deste fórum. Não vou responder à sua pergunta devido ao caráter pessoal sem relação com a proposta deste veículo. Se for de seu interesse posso publicar futuramente algo sobre as relações entre matemática e religião. Não são poucas.
Meus comentários foram feitos a título de curiosidade e não com intenssão de invadir sua privacidade. De qualquer modo, me desculpe se fui inconveniente.
ExcluirCreio que um post sobre as relações entre matemática e religião é de interesse não apenas meu, mas de muitas pessoas, pois me parece que é um tema pouco divulgado (eu mesmo nunca li algo a respeito).
AAnooniimoo
Também apenas a título de curiosidade, foi publicado ano passado um artigo no Journal of Nervous and Mental Diseases - revista indexada com fator de impacto - que dá uma validada na mediunidade: Kelly EW, Arcangel D. An investigation of mediums who claim to give information about deceased persons. J Nerv Ment Dis. 2011 Jan;199(1):11-7
ExcluirO estudo está disponibilizado traduzido aqui: http://obraspsicografadas.haaan.com/2011/uma-investigao-de-mdiuns-que-alegam-receber-informaes-sobre-pessoas-falecidas-2011/
Também houve um artigo recente validando a telepatia em uma revista do maisntream: Meta-Analysis of Free-Response Studies, 1992-2008: Assessing the Noise Reduction Model in Parapsychology. Patrizio E. Tressoldi. Psychological Bulletin, Vol. 136, No. 4, pp. 471-485, 2010
Está disponível aqui: http://www.psy.unipd.it/~tressold/cmssimple/uploads/includes/MetaFreeResp010.pdf
Enfant Terrible
ExcluirJá li muita coisa sobre parapsicologia. Sempre foi um assunto que me interessou. As referências que você cita eu não conheço. Lerei assim que puder. Mas posso adiantar que um dos principais motivos para não confiar na literatura sobre parapsicologia é a absoluta falta de justificativas. Tudo o que li até hoje se resume a meras evidências experimentais. E isso não é ciência.
Oi, Adonai
Excluirnão entendi muito bem o que você quis dizer com "absoluta falta de justificativas". Seria a ausência de um mecanismo para os fenômenos, um criticismo mais ou menos semelhante ao que Wegener enfrentou ao propor a sua Teoria da Deriva dos Continentes?
Sagan parecia ter uma opinião um tanto quanto contrária à sua. Ele considerava parte da Parapsicologia científica justamente pelas evidências experimentais. Ele disse:
"Cada área da ciência tem o seu próprio complemento de pseudociência. [...] Os psicólogos têm grande parte da psicanálise e quase toda a parapsicologia. [...] No momento em que escrevo, acho que três alegações no campo da percepção extra-sensorial (ESP) merecem estudo sério: (1) que os seres humanos conseguem (mal) influir nos geradores de números aleatórios em computadores usando apenas o pensamento; (2) que as pessoas sob privação sensorial branda conseguem receber pensamentos ou imagens que foram nelas “projetados”; e (3) que as crianças pequenas às vezes relatam detalhes de uma vida anterior que se revelam precisos ao serem verificados, e que não poderiam ser conhecidos exceto pela reencarnação. Não apresento essas afirmações por achar provável que sejam válidas (não acho), mas como exemplos de afirmações que poderiam ser verdade. Elas têm, pelo menos, um fundamento experimental, embora ainda dúbio. Claro, eu posso estar errado."
SAGAN, Carl. O mundo assombrado pelos demônios.
Enfant Terrible
ExcluirSua analogia entre parapsicologia e a teoria da deriva continental (como foi originalmente apresentada) me parece bastante feliz. O que hoje não é ciência, pode se tornar amanhã. Não basta crermos em algo. Esse algo precisa ser verdadeiro, em algum sentido. Não basta estarmos diante de uma verdade. Precisamos justificar tal verdade, para que se caracterize conhecimento científico. Justificativas são usualmente definidas por teorias ou, pelo menos, modelos. É claro que não existe um conceito claro para conceitos como justificativa, teoria e modelo. Dois autores que discutem exaustivamente isso são Newton da Costa e Patrick Suppes. Recomendo a leitura do livro Representation and Invariance of Scientific Structures, de P. Suppes (CSLI, 2000). É uma obra absolutamente soberba.
Com relação a Carl Sagan, certamente o admiro tanto pelo trabalho de divulgação científica quanto pela produção técnica. Mas a visão filosófica dele sobre ciência sempre me pareceu muito ingênua.
Continuando...
ExcluirA questão que você coloca é muito complicada. O fato é que estudos de parapsicologia até hoje não conseguiram atingir um nível de rigor que consiga convencer a comunidade científica internacional de que supostos fenômenos de telepatia, mediunidade, telecinesia e outros são reais e justificáveis a partir do que hoje se entende por ciência. Talvez os métodos hoje empregados não sejam adequados para a investigação de certos fenômenos.
Oi, Adonai
Excluirmas nos experimentos para se testar "telepatia", a teoria que aparece é que duas pessoas vivas podem enviar seus pensamentos uma para a outra. Isso em si já é uma proto-teoria. Ausência completa de teoria seria se meramente afirmássemos que houve uma co-ocorrência. A partir do momento em que postulamos uma co-relação, já estamos entrando no campo da teorização.
Quanto à "falta de convencimento", não sei se isso é exatamente um problema dos estudos em parapsicologia. Sabe-se que muitos cientistas não aceitariam os fenômenos paranormais ainda que tivessem um volume enorme de evidências empíricas irrefutáveis a favor de sua existência. E existem pesquisas de um rigor impecável, feitas inclusive com o apoio de céticos, e replicadas por eles, fornecendo evidência empírica muito próxima do que entendemos por "irrefutável". Um exemplo seria as pesquisas com a médium Piper. Ela chegou a ser citada na Enciclopédia Britânica como uma médium legítima. Outro exemplo, mais recente, seriam os próprios testes ganzfeld, que entraram em um acordo desde 1986 a respeito das diretrizes metodológicas a serem seguidas nos testes e os resultados continuaram favoráveis à existência de telepatia.
Enfant Terrible
ExcluirDeterminar se existe (ou não) correlação entre os pensamentos de duas pessoas é algo que pode ser testado experimentalmente. Concluir, a partir de uma correlação significante, que uma pessoa transmite seus pensamentos para outra é precipitação. Um teoria deveria explicar os mecanismos que tornam esse tipo de comunicação possível, se for o caso.
Com relação a cientistas que fecham suas mentes para fatos, isso ocorre em todas as áreas. Não é exclusividade da parapsicologia.
Oi, Adonai
ExcluirO mecanismo da gravidade era um mistério impenetrável na época em que Isaac Newton a conceituou, mas mesmo assim as pessoas aceitavam a sua existência. Fazia parte do conhecimento científico. Não tivemos um mecanismo para explicar a gravidade até Albert Einstein propor, em sua teoria geral da relatividade, que ela é a curvatura do espaço e do tempo. Esse caso demonstra que, para repelir uma ideia, alegar a inexistência de um mecanismo concebível não basta, visto que a curvatura do espaço e do tempo era decerto uma ideia inconcebível quando Newton propôs o conceito de gravidade. A menos que neguemos até a possibilidade de um mecanismo qualquer, não devemos descartar um conceito simplesmente porque ignoramos o dele.
O físico Roberto de Andrade Martins diz que a ideia de que "se não é possível conciliar [o fenômeno] com as teorias científicas admitidas, então este suposto fenômeno não pode ser aceito como um fenômeno suscetível de estudo científico e deverá ser considerado (provisionalmente) um pseudo-fenômeno" é "muito restritiva". E cita um contra-exemplo: "Há cem anos as medições do espectro da radiação do corpo negro estavam absolutamente em conflito com toda a física admitida. Era correto recusar as medidas do espectro do corpo negro em fins do século XIX? É aceitável recusar na ciência todos os fenômenos que entram em conflito com as teorias admitidas? É claro que não! Este critério, demasiado forte, não é aceitável."
Lembro ainda que há muitas e muitas décadas os cientistas convivem com uma altamente desconfortável ausência de teoria física: não há uma teoria que concilie a Teoria da Relatividade com a Mecânica Quântica. Se uma teoria não é, com toda a honestidade intelectual, encontrada, paciência. Falta de explicação não é razão para negar a observação, nem é razão para tirar o caráter científico da ideia em torno dela.
Enfant Terrible
ExcluirVocê demonstra desconhecer a história da gravitação de Newton. As ideias do físico inglês sobre gravitação foram questionadas durante séculos, por pessoas como Mach, Helmholtz, Hertz e outros. Mesmo recentemente John Maddox publicou artigo na Nature questionando se a teoria da gravitação de Newton seria hoje aceita para publicação em um bom periódico científico. O conceito de força de Newton tem caráter fortemente metafísico.
Outro erro que você comete é afirmar que gravidade é a curvatura do espaço e do tempo. Você precisa compreender melhor o que são teorias físicas, para depois discutir sobre parapsicologia.
Além disso, há diferenças epistemológicas profundas entre física e parapsicologia. Mesmo com suas falhas fundamentais, a gravitação universal consegue antecipar fenômenos mensuráveis com extrema precisão. Já os supostos fenômenos de telepatia e precognição ainda não contam com esse tipo de tratamento.
Oi, Adonai
Excluirindependentemente de as ideias de Newton terem sido questionadas, elas foram "aceitas". Tanto que era comum se dizer, até o final do século XIX e início do século XX, que não restava mais nada para se descobrir na Física. Atribui-se tal frase a um professor de Planck. Lorde Rayleigh disse algo bem semelhante em uma palestra, de que "quase tudo [na Física] estava compreendido", abrindo apenas exceção para três coisas: o efeito fotoelétrico, a radiação do corpo negro e a experiência de Michelson e Morley.
Sou leigo em Física, mas um trecho do livro Philosophy of Physics, de Lawrence Sklar, diz exatamente isso sobre a gravidade: "A partir da concepção da gravidade enquanto espaço-tempo curvo, própria da teoria da relatividade geral, tornou-se claro que mesmo na imagem pré relativista podemos redescrever a gravidade por meio de um espaço-tempo curvo." Esse trecho está traduzido aqui: http://criticanarede.com/cie_gravidade.html
De qualquer forma, se interpretei mal as palavras do Lawrence, ou se o próprio Lawrence errou, havendo erro em minhas colocações, agradeço quaisquer correções.
Mesmo assim creio ter mostrado que sua ideia de cientificidade não é compartilhada pelos próprios físicos, como fica claro pelas palavras de Martins.
Continuando...
ExcluirMas agora vou mudar de estratégia. Antes era minha intenção mostrar que falta de teoria não é razão para atacar a cientificidade de uma ideia, ou mesmo de todo um campo (como a Parapsicologia). Visto que você parece irredutível quanto a isso, então vou mostrar que na Parapsicologia há sim teorias.
Mais acima você disse que já leu muito sobre Parapsicologia. Mas será que você leu as melhores referências? Já leu, por exemplo, o livro "Mentes Entrelaçadas", de Dean Radin? Ou o livro "Debating Psychic Experiences"?. Este último traz uma resposta a esses chavões comuns de falta de teoria ou predictibilidade.
O trecho a seguir foi escrito por um cético:
"Many theories have been proposed, although none with the precision of general physical theories, including among others, Stanford’s (1990) Conformance Behaviour Model; Decision Augmentation Theory (May, Utts, & Spottiswoode, 1995); Walker’s (1984) quantum mechanical theory; Thermal Fluctuation Model (Mattuck, 1982), Schmidt’s (1975) mathematical theory of psi, and Statistical Balancing Theory (Pallikari, 2003)."
Mesmo ele - o cético - admite haver teorias na Parapsicologia. Aí você dirá que ainda assim não há a mesma precisão alcançada na Física, como o próprio cético observa:
“Prediction is a keystone of science. . . . Even though scientific understanding of the nature of gravity is far from complete, the effects of gravity can be easily measured by anyone; they occur in an orderly and predictable fashion for any researcher”
A resposta de um dos autores pró-paranormal é a seguinte:
Excluir"I find it astonishing that a psychologist would compare the predictability of human behavior and performance with the relatively simple phenomenon of gravity. In both Newton’s and Einstein’s theories, only two categories of simple, easily-measured variables are involved: distance and mass. None of the human sciences enjoy this luxury." [Aqui vale a menção de um trecho do livro Fact and Fraud: "Here a pertinent distinction arises between biology and the other sciences[...]sufficient variability exists among organisms that the same procedure, performed on two test subjects as nearly identical as possible, is not expected to give exactly the same result. If two virtually identical rats are treated with the same carcinogen, they are not expected to develop the same tumor in the same place at the same time."]
E:
"One of the theories [...]is Evan Harris Walker’s quantum mechanical theory, which predicted retroactive-PK effects, later found to exist (Walker, 1984, p. 321; see also, Schmidt, Morris, & Rudolph, 1986). [...] a number of leading physicists such as Henry Margenau, David Bohm, Brian Josephson, and Olivier Costa de Beauregard have repeatedly pointed out that nothing in quantum mechanics forbids psi phenomena. Costa de Beauregard (1975) even maintained that the theory of quantum physics virtually demands that psi phenomena exist, and Walker (1979) developed a theoretical model of psi based upon the orthodox von Neumann formulation of quantum mechanics."
Assim, a crítica de "absoluta falta de justificativas" é, simplesmente, equivocada.
Tenho o livro Debating Psychic Experiences em formato eletrônico e posso lhe enviar ou disponibilizar um link aqui para download, caso queira/permita. É, repito, um dos melhores livros sobre o assunto, reunindo as visões pró e contra.
Enfant Terrible
ExcluirVocê afirma que minha ideia de cientificidade não é compartilhada por outros físicos. Este é exatamente um dos pontos sobre os quais tenho insistido aqui desde o início. Pena você estar tão focado na parapsicologia e estar perdendo o rumo sobre o conceito de ciência. Eu já escrevi aqui, mais de uma vez, que não há conceitos sobre ciência, justificativa, teoria e verdade que sejam amplamente aceitos pela comunidade científica. Por isso mesmo procuro adotar a visão pragmática de que ciência é a atividade profissional exercida por pesquisadores e cientistas. E ainda assim este critério é extremamente questionável. Por isso mesmo publiquei aqui a postagem sobre o trabalho de André Assis que, apesar de ser veiculado em periódicos sérios, não qualifico como ciência. A mecânica relacional dele mais parece uma cruzada pessoal do que ciência. E é este o cuidado que tento despertar em você (até agora sem sucesso).
Não sou contra pesquisas sobre os fenômenos ditos paranormais. Mas o fato é que até agora os resultados foram incipientes e os métodos são primários. Durante décadas a Universidade de Edinburgh teve uma cátedra de parapsicologia. O Journal of Parapsychology (uma de minhas principais referências) é indexado no Science Citation Index. Mas isso tudo mostra apenas uma coisa: interesse reconhecido sobre o tema. O mesmo vale para as referências que você menciona. Mas resultados significantes... isso ainda não aconteceu.
Com relação à relatividade geral, é um erro grave se valer de palavras escritas em um texto de divulgação. Para discutir sobre o tema é fundamental conhecê-lo. Pretendo postar em algum momento futuro algo sobre a relatividade geral de Einstein, para tentar desfazer alguns mitos sobre essa teoria.
Oi, Adonai
ExcluirNote que eu não estou discutindo a relatividade geral em si. Meu foco era apenas mostrar a ausência de teorias em ciências bem estabelecidas como a Física, sem ser meu intuito me aprofundar nelas. Poderia acrescentar outras a título de exemplo, como o "hard problem" da Biologia, sem querer me aprofundar também. Mas concordo que para se discutir um tema é fundamental conhecê-lo e, repito, ficaria feliz com quaisquer correções de sua parte, e aguardo ansioso o seu post sobre o assunto. Mas será que você não está caindo nesse mesmo erro ao falar da Parapsicologia? Será que você está passando uma imagem verdadeira do campo quando diz que os resultados são incipientes e os métodos primários? Os céticos que estão diretamente envolvidos no campo não possuem essa visão. Muito pelo contrário, aliás. Richard Wiseman, por exemplo, disse recentemente: "I agree that by the standards of any other area of science that remote viewing is proven, but begs the question: do we need higher standards of evidence when we study the paranormal? I think we do." Ray Hyman, outro cético, disse em dezembro de 1995: "I want to state that I believe that the SAIC experiments as well as the contemporary ganzfeld experiments display methodological and statistical sophistication well above previous parapsychological research. Despite better controls and careful use of statistical inference, the investigators seem to be getting significant results that do not appear to derive from the more obvious flaws of previous research." A própria Susan Blackmore disse sobre os experimentos ganzfeld: "Os resultados desses estudos automatizados foram surpreendentemente significativos. Minha própria impressão ao ler o texto muitas vezes foi que as experiências foram muito bem-elaboradas e os resultados decerto não se deviam ao acaso. Caso fossem provenientes de algo que não fosse psi, não estava óbvio o que era. Em outras palavras, essas experiências se destacavam de toda a massa de estudos fracassados, de pouca importância ou obviamente falhos. [...] Todos os interessados em parapsicologia, sejam crentes, descrentes ou céticos, devem levar esses resultados a sério. Não podem ser facilmente descartados. Obedecem à maioria, se não a todos, os requisitos definidos pelos céticos, e os resultados foram importantíssimos, convincentes para muitos da realidade da psi em laboratório."
E o mundo da Parapsicologia não se resume ao que é publicado no Journal of Parapsychology. Há muita coisa boa publicada em jornais do mainstream - como os dois artigos que citei no Journal of Nervous and Mental Diseases e no Psychological Bulletin - e em outros jornais parapsicológicos, como o Journal of Scientific Exploration ou o Proceedings of the Society for Psychical Research, e em livros. Há lixo também, claro. Mas encontrar o ouro no meio desse lixo não chega a ser uma tarefa ingrata. O artigo "Three new cases of the reincarnation type in Sri Lanka with written records made before verification” publicado em 1988 no J. Sci. Exploration, por exemplo, é ouro puro. Mais recente, o artigo de 2005 intitulado "Children who claim to remember previous lives: Cases with written records made before the previous personality was identified" também classifico como ouro puro.
Você ainda diz que "durante décadas a Universidade de Edinburgh teve uma cátedra de parapsicologia". Que eu saiba ainda tem. É a Koestler Parapsychology Unit. O site deles é esse: http://www.koestler-parapsychology.psy.ed.ac.uk/ E há muitos outros centros de pesquisa parapsicológicos em universidades importantes espalhados pelo mundo.
Experiência de EMILY ROSA. Se verificarmos que o que ela observou nos trabalhos das enfermeiras e o que demonstrou são coisas diferentes do que quis provar. Selecionou pessoas que se diziam capazes de sentir o "campo energético humano" (talvez algumas sentissem, mas creio que a maioria não)e impos a essas pessoas um teste de "advinhação". O que ela descobriria se tivesse feito uma pesquisa, procurando saber qual o indice de melhora ou cura dos pacientes que passaram pelo tratamento de toque terapêutico ???? Seria algo mais realista, pois estaria verificando os resultados do tratamento. FICOU CONHECIDO por ser muito jovem e questionadora,algo admirávell realmente.
ExcluirReferente ao item 3 de conclusão, descrito abaixo: As paranormalidades, mediunidades, são ainda hoje para ciência assunto que ela não tem "ferramentas" par explicar, medir. Até que se fosse inventado o microscópio, o átomo não era conhecido, mas sempre existiu. Uma célebre frase exprime bem a pequines da nossa ciência "Ha mais mistérios entre o céu e a terra do que julga nossa vã Filosofia" 3) Ciência é fundamental para avaliar de maneira sensata crenças populares em mediunidade, telepatia, precognição, telecinesia, vida após a morte, contatos com extraterrestres, homeopatia, medicina ortomolecular, programação neurolinguística, visões divinas, astrologia e demais modismos culturais do momento. O fato da CIENCIA não conseguir provar tal coisa, não quer dizer que essa coisa exista. JESUS já disse: Se não credes quando vos falo das coisas da terra, como crereis quando vos falar das coisas do céu?” ... E por ai vai.. ainda estamos gatinhando em todos os sentidos... mas somos seres em evolução... FORTE ABRAÇO JCSA
JCSA
ExcluirNão compreendo quando você afirma que um teste experimental sobre índices de melhora e cura seria mais realista. Mas concordo que seria algo desejável saber. Que existem muitos mistérios a serem desvendados, não há dúvida. Evidências curiosas de certos fenômenos ditos paranormais existem. Só não sei se um dia teremos todas as respostas. Espero que não.
- Adonai:Não compreendo quando você afirma que um teste experimental sobre índices de melhora e cura seria mais realista.
ExcluirEstou dizendo que, se Emily ao contratrio de tentar provar que os tratamentos "toque terapeutico" eram uma farsa, através de um teste de "advinhação", fizesse uma pesquiza "realista" com os verdadeiros resultados,levantando as fichas dos pacientes que se submetiam ao tratameto, e verificando se houve ou não melhora e cura dessas pessoas. Quantas melhoraram ou foram curas, qual o percentual de pessoas beneficiadas com o tratamento. Como disse, no caso o que realmente chamou a atenção de todos foi a pouca idade de Emily, na época considerada "Gênio". Tentei saber como está e o que faz Emily nos dias de hoje, mas não consegui. Teria esta informação ?
Com certeza todas as respostas virão, como veem vindo no decorrer dos séculOs...FORTE ABRAÇO JCSA
JCSA
ExcluirApesar de sua sugestão ser evidentemente interessante, não foi esta a proposta de Rosa. O que ela fez foi testar a alegação de que certas pessoas conseguem sentir um suposto campo energético humano. Tais pessoas também afirmam ter o poder de diagnóstico e cura. Mas essas alegações não foram avaliadas. Sua sugestão de pesquisa requer um aparato muito mais sofisticado do que aquele empregado por ela.
Com relação ao destino de Rosa, ela se graduou em Psicologia pela Universidade do Colorado, em Denver. Isso foi em 2009. Não disponho de informações mais recentes.
Adonai
ResponderExcluirNo fim deste texto, vc escreve:
"[...] Ciência não se faz apenas em um laboratório ou escritório. Universidades e centros de pesquisa devem estender sua influência para a sociedade como um todo. Afinal, se não fosse pela iniciativa de Lundberg, o trabalho de Rosa teria se resumido a algo apenas bonitinho para familiares e amigos."
1) Ao menos do modo como vc escreve, dá-se a entender que a garota "fez ciência" ao realizar, aplicar e possivelmente idealizar este experimento.
2) No entanto, em outro texto, vc afirma que os únicos que "fazem Matemática" são os matemáticos e assim por diante.
Seguindo este raciocínio, o mesmo valeria para a Ciência, ou seja, os únicos que "fazem Ciência" são os cientistas.
3) No entanto, em uma palestra do Newton da Costa, em 2010, no qual vc foi o responsável por apresentar o professor Newton para a plateia, vc afirmou que na UFPR e outras instituições temos *pesquisadores* e não cientistas.
Vc justifica isto afirmando que o cientista, por definição, é aquele que "muda a cara da Ciência". Como a maioria dos pesquisadores não fazem isto, não seriam pois, considerados cientistas.
Bom, seguindo esta linha de raciocínio, somente aqueles que "mudam a cara da Ciência" (os cientistas, no seu entender) é que efetivamente "fazem Ciência".
No entanto, este experimento realizado pela garota em nada "mudou a cara da Ciência", mas apenas mostrou um caminho lógico alternativo para abordar determinado assunto e suas possíveis farsas. Em termos conceituais e de definição não foi nada inovador.
Sendo assim, se a garota "não mudou a cara da Ciência" ela não poderia ser classificada como cientista e, se ela não é cientista, necessariamente ela "não fez Ciência", já que os únicos que "fazem Ciência", segundo sua análise, são os cientistas!!!!!!
Se a garota "não fez Ciência" com este experimento (conclusão naturalmente obtida pela análise do que vc diz anteriormente, em referência aos itens 2 e 3), mas neste texto vc dá a entender que ela, de fato, "fez Ciência" com este experimento, então isto aponta para uma aparente contradição dos itens 2 e 3 em relação ao item número 1, que se refere ao texto desta postagem.
Isto porque a garota não estaria, simultaneamente, "fazendo Ciência" (remetente ao texto e ao item 1) e "não fazendo Ciência" (conclusão baseada na verificação dos itens 2 e 3, com base no que vc disse em outros momentos e tópicos).
Não consigo ver como evitar esta contradição sem perder de vista o caráter lógico e a coerência daquilo que já foi exposto por vc aqui, em outro tópico e no que vc disse na introdução da palestra do professor Newton!!!!!!
Poderia esclarecer melhor toda esta situação?????
Obrigado.
Leandro
ResponderExcluirDe fato faço uma distinção entre pesquisador e cientista. Mas veja que não me referi a Rosa como cientista. Apenas afirmei que ela fez ciência de boa qualidade. Todo pesquisador (no sentido acadêmico da palavra) produz conhecimento científico. E conhecimento científico faz parte da ciência. Concordo que seria exagero dizer que Rosa mudou a cara da ciência. Mas ainda assim ela fez uma contribuição científica relevante e de forma elegante, pela sua simplicidade. Portanto, aos nove anos ela se tornou uma importante pesquisadora.
DICA: estude a possibilidade de adicionar o gadget (ou widget, não sei a diferença) chamado "comentários recentes" (ou "últimos comentários") no seu blog para que a gente possa ver e ler suas respostas quando sair algum comentário em posts antigos (poderia ser abaixo de TOTAL DE VISUALIZAÇÕES DE PÁGINA).
ResponderExcluirÓtima ideia. Verei como posso fazer isso. Grato.
ExcluirApesar de ser ignorante em termos de "ciências", vejo que a humanidade começa a gatinhar neste assunto,e que a momentânica falta de recursos materiais para provar que certas forças e energias existem, a ciência por hora as negas.
ResponderExcluirA ciência não nega forças e energias! A comunidade científica encontra dificuldade para compreender certos discursos não qualificados em favor da existência de forças e energias misteriosas. Só isso. Pode crer numa coisa: há muita gente boa investigando seriamente os chamados fenômenos paranormais. O problema é que, por enquanto, os resultados são insípidos.
ExcluirSobre o episódio de Emily Rosa, há muitas críticas ao experimento realizado. Veja, por exemplo, essa crítica feita pelos próprios céticos:
ResponderExcluirhttp://www.rationalmagic.com/RMS/rms-jamacrit.html
Mal dá para acreditar que uma revista como a JAMA publicou tal artigo.