sexta-feira, 22 de maio de 2015
Ode para os delicados
O delicado não magoa. Tem medo de ser magoado.
O educado denuncia. Tem medo das ramificações dos erros.
O delicado denuncia apenas os poderosos. Imagina que eles não se magoam.
O educado denuncia erros. Não interessa se magoa ou não.
O delicado reclama.
O educado constrói.
O delicado se cala diante do discurso do respeito como um direito de todos.
O educado questiona.
O delicado tolera erros na língua natal a ponto de não mais percebê-los.
O educado conhece as ambiguidades das linguagens naturais, ainda que sigam normas cultas. E corrupção da língua certamente não ajuda.
O delicado tolera e até incentiva políticas afirmativas em defesa dos oprimidos.
O educado reconhece que nenhuma política pode ser imposta sem uma sólida validação científica.
O delicado julga que minorias são delicadas.
O educado percebe que a posição das minorias é delicada.
O delicado acha que é educado pedir licença.
O educado sabe que é delicado pedir licença.
O delicado exige que seus direitos sejam reconhecidos.
O educado é fiel aos seus deveres.
O delicado percebe apenas duas cores: preto e branco.
O educado sabe que não percebe todas as cores.
O delicado luta por sua inserção social.
O educado luta pela transformação social.
O delicado se ofende, grita, bate panelas, comenta kkkkkkk, domina apenas rudimentos de linguagem.
O educado aprende e discute sobre o que aprendeu.
O delicado é oprimido por si mesmo, e o educado sabe disso.
O delicado defende cadeia para todo político corrupto.
O educado sabe que Abraham Lincoln fez uso de corrupção para abolir a escravidão de seu país.
O delicado se vitimiza, alegando "Você sabe o que eu quis dizer."
O educado assume responsabilidade sobre o que diz e somente presta atenção no que ouve.
O delicado julga que críticas são feitas pensando nele.
O educado percebe um mundo um pouco maior.
O delicado é guiado por desejos. O educado também. A diferença é que o educado sabe disso.
O delicado é frágil e se ilude com a força do coletivo.
O educado é frágil e se espanta com a força do coletivo.
O delicado é político.
O educado é educado.
Um delicado fica longe da educação. Um educado tenta se afastar da delicadeza.
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Nossa!
ResponderExcluirCara, este mundinho nosso é cansativo.
ResponderExcluirMuito, Adonai, à exaustão.
ExcluirEste comentário foi removido pelo autor.
ExcluirMuito bom. Apenas dois pequenos comentários: i) um dos erros que o educado irá denunciar é o desrespeito aos seus direitos (apesar disso ofender pessoas que o considerarão delicado) e; ii) sólida validação científica de politicas públicas é muito desejável, mas não é condição suficiente: políticas racistas, para dar um exemplo, já foram fundamentadas em bases supostamente científicas.
ResponderExcluirCaro Stafusa
ExcluirPor conta disso que usei o termo "validação". Se você conhecer alguma pesquisa que valide as políticas raciais em nosso país, agradeço. O processo de validação consiste em uma comparação do antes com o depois e precisa de veiculação em periódico de alto nível. Se existir algo assim, certamente posso reconsiderar minha posição sobre o tema.
Será que essa é uma exigência realista? Alguém poderia ter feito um "antes X depois" da abolição da escravatura nos EUA?
ExcluirStafusa
ExcluirSe é uma exigência realista, não sei dizer. Mas sua segunda questão é extremamente pertinente.
Teoria da Evolução de Darwin foi utilizada como pretexto para a eugenia e massacre de milhões de judeus.
ExcluirNo mais, concordo com o Stafusa, muito bom. Não sabia que tinha este lado poético professor Adonai.
Este comentário foi removido pelo autor.
ExcluirAdonai
ResponderExcluirUm texto transfinito!
Uma prosa poética!
Ou uma poesia em prosa?
Fico feliz que tenha gostado, Mariia.
ExcluirAs pessoas muitas vezes confundem educado com escolarizado, quando, na minha opinião, embora haja relação estre maior escolaridade e educação (coisas no meu ver distintas), há os pontos fora da curva; Faraday, talvez Tesla, Machado de Assis, Saramago etc. Só por curiosidade, a pessoa mais sábia com quem pessoalmente conversei não foi um professor (muito longe disso, com raríssimas excessões) nem acadêmicos: foi com um mendigo.
ResponderExcluirA sociedade humana é curiosíssima.
Eduardo
ExcluirSão raros, mas existem mendigos com ótima formação escolar. Você ainda tem contato com esta pessoa? Esse tipo de gente certamente me interessa.
Adonai, infelizmente não. Há pessoas que a gente encontra ao acaso de um dia. E às vezes marcam mais do que as da rotina.
ExcluirProfessor, frequentemente estou visitando o seu blog. Quero agradecer pelas postagens e pelo incentivo ao estudo com seriedade. Desde novo tinha o sonho de trilhar algum caminho nas ciências da natureza e exatas, mas como a vida é dura, muitas vezes somos empurrados para locais distantes (talvez por fraqueza pessoal). Criei coragem e estou retornando ao caminho que desejo. Sei que passarei por algumas dificuldades, como por exemplo minha idade "avançada", sou um jovem-velho de 30 anos e por isso não vislumbro chegar muito longe (isso pode ser paranoia de minha parte). Tenho alguns projetos por terminar, e daqui a 2 anos pretendo iniciar um curso de Engenharia Elétrica.
ResponderExcluirGostei bastante da sua Ode, apesar de ter uma certa resistência por este tipo de arte rs. Uma pergunta para o Senhor, que também me faço frequentemente: o estudo é uma questão de prazer pessoal, uma necessidade da inteligência humana, ou uma busca de reconhecimento?
Uilmar
ExcluirSensacionais os seus planos. Espero que consiga colocá-los em prática.
Com relação à sua pergunta, creio que você queira uma resposta pessoal. Nunca estudei por prazer. É mais uma necessidade, quase uma compulsão. Curiosidade é um grande estimulante. Quero sim contribuir com algo relevante em ciência. E, para avaliar relevância, não existe outro instrumento a não ser o reconhecimento. Mas o reconhecimento que busco não é sobre a minha pessoa, porém sobre uma obra. Gosto mais de obras do que de pessoas.
O senhor assistiu ao filme Whiplash, lançado ano passado?
ResponderExcluirSebastião
Sim, Sebastião. É uma obra soberba. O povo daqui não tem ideia do que é pressão.
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